sábado, 2 de abril de 2011

O dia em que eu fui eliminado


Lembro-me de que era uma terça-feira. Passei o dia apreensivo, quase todo sozinho. Sem saber direito no que pensar – a bem da verdade, sem muita confiança. Quase não comi. Não abri um livro pro tempo passar mais rápido, nem desfrutei da piscina sob sol forte e muito menos cheguei perto da academia. No fim da tarde me abri com algumas pessoas, me deram uma força. Posso dizer que essa morbidez é o resumo desse dia até a hora em que o monitor da sala foi ligado e o Bial apareceu, dando aquele boa noite com cara de bobo.

Eu já havia estado naquela situação outras duas ou três vezes. Mas nenhuma delas me deixou tão baqueado. Talvez fosse mal pressentimento. Eu enfrentava duas pessoas: uma mulher bem gostosa, de algum lugar do Sul, e um rapaz meio afeminado, do Norte ou Nordeste. Sinceramente não sabia se qualquer destas características poderia pesar a favor deles ou de mim. Nos outros paredões tinha sido mais fácil.

O que me recordo melhor dessa noite é que, após um suspense interminável, a câmera mostrou minha torcida. E estava todo mundo lá: minha família, meus amigos de infância, a galera da faculdade, o pessoal do trabalho e mais um monte de gente que eu não conhecia com camisa com a minha foto. Eu gritei, apalpei a tela e, se não me engano, usei interjeições com palavras que não deveriam ter ido ao ar naquele horário. Acontece, era ao vivo.

Aí vieram os comerciais, o Bial enrolou mais um pouco e chamou a mim e aos outros dois elimináveis para recebermos o veredicto do povo. Antes, falou algo complexo sobre guerreiros, naves espaciais, bandas de jazz, Las Vegas, pipoca com leite condensado, pênaltis não marcados e o Rafiki do Rei Leão, que acho que ninguém entendeu. E com uns cinquenta e poucos por cento dos votos o eliminado era eu.

Abracei todo mundo, até quem eu não gostava – um deles me ajudou a carregar a mala até a porta. No abraço mais demorado, ouvi baixinho um “a gente conversa lá fora, me espera”. Depois, uns três “nossa amizade é pra sempre, irmão”. Então saí e um mundo de gente me aplaudiu e gritou meu nome – não entendi por que, já que eu tinha perdido o jogo. Troquei uma ideia rápida com o Bial, falei que meu erro foi ter sido eu mesmo e pedi desculpas à minha família por qualquer coisa. Chorei um pouquinho.

No mesmo dia descobri em que a minha vida tinha se tornado. Eu tinha uma infinidade de fã-clubes espalhados pelo Brasil – e sem saber fazer nada da vida. Isso sem falar do tanto de comunidades em sites de relacionamentos, a maior delas com muito mais de cem mil pessoas. Loucos! Daí em diante todo mundo queria tirar foto comigo, me pagavam para ir a festas, saí na capa de todas as revistas de televisão, fui ao Faustão e peguei muita mulher – até emendei um breve romance com uma atriz dessas que namoram todo mundo. Farra total.

É, mas com o passar dos meses minha popularidade foi, naturalmente, caindo. Passei a aparecer durante a semana em programas menos badalados de outras emissoras, até que acabaram de vez os convites. Um a um, os fãs-clubes foram sendo fechados. Revistas, nunca mais. Meu último trampo tem um tempinho: fui repórter de um programa que cobre eventos na emissora da minha cidade por um tempo, até que fui dispensado porque não dava muita audiência. E, desde então, procuro uma oportunidade de mostrar meu talento, em qualquer ramo de atividade. Estou precisando mesmo, a grana da época das vacas gordas já se foi.

Até que hoje, passeando despercebido pela rua, vi o anúncio de temos vagas naquela plaquinha ali na rua e entrei. Esta é minha experiência. Começo amanhã?