segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O pendurar das chuteiras


Os tempos mudaram e ele sabia muito bem que já não era mais o mesmo. Nem se quisesse ser. Restavam as histórias da fase Don Juan. Perdeu as contas de quantas mulheres teve para si. Amou muito, amou muitas. Não houve missão a que se tenha se proposto que não tivesse concluído com o mais absoluto nível de sucesso.

A verdade é que era um apaixonado pela alma feminina. E, tanto quanto, pelos corpos. Usava com maestria a inteligência e fazia do galanteio uma ciência quase exata. Os resultados eram previsíveis e naturalmente alcançados, com que sem maiores esforços. Desde a adolescência, foi conquistador. Sempre sabia o que falar, a quem dizer, o instante ideal de cada palavra, o preciso tom de voz a ser usado e a que distância do ouvido estar. A receita do bote fatal tornara-se, então, infalível. Por anos.

Até que um dia, em meio a mais um entre tantos processos de conquistas, as coisas saíram dos eixos. Não estava nos planos que fosse ele o fisgado. Não daquela forma. Mas não teve escolhas: foi inevitável ver-se completamente atado a uma sensação boa jamais experimentada. Encerrava-se ali uma das maiores carreiras de sucesso de todos os tempos. Ele entregava, em definitivo, seu coração a quem chamava carinhosamente de Pequena e transformava-se em uma lenda viva.

Agora não confirmava a antiga fama, apenas sorria um riso de canto discretamente saudosista. Os amigos de outras datas contavam orgulhosos seus feitos nas rodas, mas ele desconversava, mudava de assunto. No máximo, defendia que os tempos eram outros e a sociedade, diferente. Mas no happy hour depois das reuniões de trabalho de quinta-feira, era ele quem escrevia, a pedidos, os bilhetes nos guardanapos que os amigos assinavam e os garçons distribuíam às moças pelas mesas do barzinho. E o índice de sucesso continuava inacreditavelmente alto.