A sentença foi asperamente direta: prisão perpétua. Nunca mais veria a luz do Sol, condenado a passar o resto dos seus dias trancafiado naquele minúsculo espaço solitário. Pior, sem qualquer julgamento. Sua inocência, embora absolutamente presumível, sequer foi considerada. Muito menos o histórico de bons precedentes.
As condições de sobrevivência se tornaram as piores possíveis. Escuridão, cheiro de mofo, chão duro. E a total ausência de qualquer contato externo, de afago, essa a mais triste consequência do cárcere decorrente de um crime que ele não cometera. Do céu ao inferno em instantes, sem chance de defesa, sem júri.
A primeira noite sozinho na masmorra foi péssima, a pior. Jogado, ainda não acreditava no que estava acontecendo, mesmo depois do estrondo das portas batidas, quando o silêncio absoluto ditava o ritmo seco da nova realidade. O clima quente e abafado compunha um cenário de total abandono. Talvez nunca mais tivesse contato com uma pessoa. E nunca mais sentisse um abraço. Não pôde perceber a claridade do raiar da manhã. E assim se passaram semanas. Meses. Os primeiros anos.
Os pelos da face gradativamente se coloriram de um cinza triste. Tornou-se a imagem do descuido e do desamparo. Condenado por um crime que ele não cometera, se lembrava cada vez menos dos dias bons, de risos e afeto. Das noites na cama de casal macia limpinha. Aos poucos, a memória começava a se apagar, consumida pela escuridão habitual do calabouço empoeirado.
Quando a esperança já não fazia mais parte do seu vocabulário, anos depois da covarde sentença, foi surpreendido com uma fresta de luz. Os feixes de vida cresceram e iluminaram a sua solitária. As portas se abriram e todo o ambiente respirou ar puro. Outra vez, estava frente a frente com seu algoz, a pessoa que havia lhe imposto autoritariamente a pena perpétua.
O carrasco o fitou por instantes e o tomou pelos braços num gesto silencioso carregado de arrependimento. Ofereceu a ele um abraço de reconciliação e um tímido, mas sincero, sorriso de pedido de desculpas.
Ele estava livre de novo.
De volta à mesma cama macia, preferiu esquecer-se dos infinitos dias em que cumpriu pena num canto do guarda-roupa, condenado ao esquecimento e culpado por ser um ursinho de pelúcia dado de presente de Dia dos Namorados em um relacionamento que terminou. Enfim, foi absolvido. Salvo pelos poderes do tempo.
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