Viagem de volta para casa. O ônibus até que era confortável, daqueles que a poltrona quase deita e tem apoio para as pernas. Se nada desse errado, estaria em casa em mais ou menos 11 horas. Na poltrona 35, eu já estava pronto para partir: blusa de frio, pacote de salgadinhos, fone à mão, livro aberto. Após alguns estranhos minutos de demora para partir, entendi o porquê: um clandestino – que viajava encolhido atrás da 46, escondido entre o último banco e a parede do ônibus, em frente ao banheiro – fora descoberto.
O cara que o encontrou viajaria com a esposa e os dois filhos nas últimas quatro poltronas do lado do condutor do coletivo. Coincidentemente era policial. Chamou o motorista, que ao ver o rapaz agachado, exclamou o que deixou todos os passageiros ainda mais confusos: “Ah, não! Você aqui de novo?!”
O clandestino se levantou. Disse ser menor de idade, embora fosse a maior pessoa do ônibus. Magrelão. Os traços pareciam mesmo de uns 16 ou 17 anos. Revelou que vinha de Goiânia e sua intenção era ir até o Rio de Janeiro. Disse ser da favela do Jacarezinho. A PM foi acionada e ele ficou por lá. O ônibus partiu. Dizem que até uma equipe de TV apareceu por lá para entrevistar o rapaz.
Eu me perguntava se, caso seus planos tivessem sucesso, ele aguentaria o frio da noite com aquele shortinho. E, dada a indignação do motorista, qual era a frequência das viagens interestaduais daquele jovem.
Qual seria a hora certa de entrar no ônibus sorrateiramente? E de sair? Teria uma técnica para pular para uma poltrona vazia sem ser percebido? Talvez deitado, pelo compartimento superior de malas. E se a vontade de ir ao banheiro batesse de uma vez, com ele agachado lá atrás, como faria? Refiro-me ao número dois.
Quantos estados ele conhecia? Será que viajava gratuitamente e, ao chegar ao destino, participava de eventos com entradas despercebidas por seguranças e organizadores? Tipo: segunda, cinema. Entra por cima, na salinha do projetor. Terça: teatro, pela janela do camarim. Quarta: futebol, fantasiado de mascote cabeçudo. Quinta, show sertanejo. Esse é fácil, só entrar de chapéu, segurando um violão e se dizer o roadie da banda. Sexta, cervejinha em boteco chique. Camisa branca, gravata borboleta e atender dois ou três pedidos de clientes, fazendo-se de garçom. O sábado sempre varia, de feira de filhotes a calourada do DCE. De vale-tudo a show do Franz Ferdinand. De automobilismo a casas de striptease. Domingo, dia de entrar em outro ônibus e conhecer outros lugares, outras culturas, outras pessoas.
Será que já conheceu a Europa, viajando clandestinamente de avião? Ou de navio. De iate? Falava outras línguas, pelo menos inglês? Amazônia, Pantanal? Será que já entrou sem credencial em uma coletiva do Dunga? Tudo deve ter começado quando, aos 11 anos, foi à primeira festa de 15 anos como penetra. Nunca mais parou.
A tranquilidade do clandestino enquanto se levantava do esconderijo, logo ao ser desmascarado, me marcou. Que segurança, que certeza do que fazia. Olho pela última vez para a 46 e tento me concentrar no livro em minhas mãos, a cidade ficou pra trás. A viagem vai ser longa.
O cara que o encontrou viajaria com a esposa e os dois filhos nas últimas quatro poltronas do lado do condutor do coletivo. Coincidentemente era policial. Chamou o motorista, que ao ver o rapaz agachado, exclamou o que deixou todos os passageiros ainda mais confusos: “Ah, não! Você aqui de novo?!”
O clandestino se levantou. Disse ser menor de idade, embora fosse a maior pessoa do ônibus. Magrelão. Os traços pareciam mesmo de uns 16 ou 17 anos. Revelou que vinha de Goiânia e sua intenção era ir até o Rio de Janeiro. Disse ser da favela do Jacarezinho. A PM foi acionada e ele ficou por lá. O ônibus partiu. Dizem que até uma equipe de TV apareceu por lá para entrevistar o rapaz.
Eu me perguntava se, caso seus planos tivessem sucesso, ele aguentaria o frio da noite com aquele shortinho. E, dada a indignação do motorista, qual era a frequência das viagens interestaduais daquele jovem.
Qual seria a hora certa de entrar no ônibus sorrateiramente? E de sair? Teria uma técnica para pular para uma poltrona vazia sem ser percebido? Talvez deitado, pelo compartimento superior de malas. E se a vontade de ir ao banheiro batesse de uma vez, com ele agachado lá atrás, como faria? Refiro-me ao número dois.
Quantos estados ele conhecia? Será que viajava gratuitamente e, ao chegar ao destino, participava de eventos com entradas despercebidas por seguranças e organizadores? Tipo: segunda, cinema. Entra por cima, na salinha do projetor. Terça: teatro, pela janela do camarim. Quarta: futebol, fantasiado de mascote cabeçudo. Quinta, show sertanejo. Esse é fácil, só entrar de chapéu, segurando um violão e se dizer o roadie da banda. Sexta, cervejinha em boteco chique. Camisa branca, gravata borboleta e atender dois ou três pedidos de clientes, fazendo-se de garçom. O sábado sempre varia, de feira de filhotes a calourada do DCE. De vale-tudo a show do Franz Ferdinand. De automobilismo a casas de striptease. Domingo, dia de entrar em outro ônibus e conhecer outros lugares, outras culturas, outras pessoas.
Será que já conheceu a Europa, viajando clandestinamente de avião? Ou de navio. De iate? Falava outras línguas, pelo menos inglês? Amazônia, Pantanal? Será que já entrou sem credencial em uma coletiva do Dunga? Tudo deve ter começado quando, aos 11 anos, foi à primeira festa de 15 anos como penetra. Nunca mais parou.
A tranquilidade do clandestino enquanto se levantava do esconderijo, logo ao ser desmascarado, me marcou. Que segurança, que certeza do que fazia. Olho pela última vez para a 46 e tento me concentrar no livro em minhas mãos, a cidade ficou pra trás. A viagem vai ser longa.
7 comentários:
Haha! Esse seria o "Impostor" da classe baixa. Trajando um tradicional shortinho no estilo "Muqueca".
Eu ia fazer a mesma comparação com o Impostor. Nem faz muito tempo que o CQC fez uma matéria mesmo estilo.
Os penetras estão fazendo escola.
Marcelo Shorts???
Genial!
Rizio???
Maicou matou a xarada.
O cara era bastante semelhante com o Rizzio mesmo.
Acho que era o próprio.
É a malícia e a criatividade do povo brasileiro que tenta passar por baixo da roleta mesmo depois dos 25.
Realmente a equipe de TV foi até lá. Dá uma olhada:
http://www.ntvnet.com.br/noticias/?n=1839&p=1
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