domingo, 18 de dezembro de 2011

Dia 25

Já era manhã do dia 25 quando ele chegou de volta à casa, depois de uma longa e cansativa noite de trabalho. O dia já estava claro e, ao longe, o Sol forte iluminava a imensidão branca e fria. O corpo doía, o esforço fora grande. Ele sabia que já não era mais um mocinho e precisava se cuidar, mas o bem que o ofício lhe fazia era tamanho que ele desafiava a própria saúde, ano após ano.

Embora o sono pesasse seus olhos, ainda não era hora de dormir. Acomodou seus companheiros de jornada, os animais, nos aposentos deles e não saiu de lá até certificar-se de que todos estavam bem, que suportaram a pesada madrugada de labuta. Alimentou e deu de beber a um por um – era o mínimo que poderia fazer aos que o levaram com a força do corpo aonde ele pediu durante horas. Abaixado, conferiu os cascos, sarou pequenas feridas nos couros dos bichos abertas por passagens em lugares de difícil acesso. Com certa dificuldade, levantou-se, afagou a cabeça de um deles e sorriu. Depois, caminhou, a passos lentos, rumo à casa.

Enquanto suas botas quebravam a fina camada de gelo no chão entre o estábulo e o lar, ele olhava, orgulhoso, o saco vazio em suas mãos e lembrava-se da noite. A avaliação fora bem positiva, conseguira deixar algo de especial por onde passara. Um menino ganhou um carrinho de controle remoto, uma menina recebeu a boneca que falava. Um rapaz foi surpreendido com um boné que paquerou durante meses na vitrine de uma loja e uma senhora trocou a geladeira depois de algumas décadas. Um pai de família ganhou um emprego melhor, uma jovem estava muito feliz com o novo namorado e dois irmãos conseguiram abrir uma empresa. Um andarilho matou a fome com um prato de sopa quente e um casal brigado se entendeu outra vez.

Em casa, deixou o gorro em uma cadeira de madeira perto da porta, enquanto tirava as botas. Levou o casaco e as calças vermelhas à lavanderia. Como nos outros anos, chegou a cogitar abandonar o posto, mas sabia que, quando se levantasse, estaria melhor e veria que tudo valeu a pena. Pensou ainda em comer algo antes de se render ao cansaço, mas as energias que tinha no corpo só foram suficientes para que ele chegasse ao quarto. Só acordaria à noite. Antes de se entregar ao sono, porém, o velho Noel verificou, sem muita esperança, suas meias penduradas perto da janela. Vazias. Por mais um ano, ninguém se lembrara dele.

Mas dormiu feliz, mesmo assim. O que importava para ele era que os outros pudessem ter um feliz Natal. E o que cabia a ele, ele tinha feito.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Sobre Viçosa, uma crônica e interpretação de textos



Há alguns dias, escrevi uma crônica que marcou minha simples carreira como escritor e mudou pra sempre a história deste blog. E o melhor de tudo: escrevi de forma sincera, despretensiosa, sobre algo que eu conheço e realmente gosto, a cidade de Viçosa e a UFV. Se alguém não sabe e se interessou em saber, sou formado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Viçosa e morei lá de 2004 a 2007. Sem o menor pingo de dúvida, os melhores anos da minha vida.

Após a formatura, ganhei o mundo. E, vez ou outra, retorno a Viçosa. Algumas coisas mudam, claro, mas sempre sinto que a essência do lugar continua a mesma. Um fim de semana antes da fatídica crônica, voltei, depois de anos, a uma Cervejada. Foi diferente, já não conhecia mais quase ninguém, mas foi emocionante ver que tantas pessoas estavam vivendo o que um dia eu vivi naquela mesma lama. Dias antes, eu havia recebido a pior notícia do ano: um grande amigo dos tempos da faculdade havia deixado este mundo. O baque com o falecimento de uma pessoa especial contribuiu para que eu refletisse o quão importante foram pra mim os momentos passados nesse pontinho da Zona da Mata mineira.

Assim surgiu o texto. De forma leve, só pelo prazer de escrever, como tantos outros aqui arquivados. Mas, sem querer, acho que contei a história de vida universitária de muita gente. Gente que chega a Viçosa sem ter muita certeza se vai ficar por lá ou se tomou a decisão mais certa e sai agradecendo a quem quer que acredite como força maior pelo que viveu.

Prova disso é que a crônica foi lida por mais de 11.500 pessoas apenas no dia seguinte à postagem. No facebook, já foi compartilhada mais de 6.000 vezes. Tive o cuidado de não incluir nada pessoal e agora concluo que a essência da vida universitária em Viçosa é a mesma para muita gente. Muitos amigos disseram-se orgulhosos de mim, muitos antigos amigos se manifestaram novamente e muitos conhecidos e desconhecidos me parabenizaram pelo texto. Mas eu não fiz nada, só tentei descrever em palavras o que todo mundo está cansado de saber.

Quero agradecer a todos que comentaram. Todos mesmo. Escritores, por mais amadores que sejam (como eu), precisam de retorno para saber se estão no rumo certo. Foi por meio dessas manifestações que tive certeza de que atingi tanta gente de forma tão positiva. Palavras de ex-moradores da cidade e ex-estudantes da universidade, formandos, futuros alunos, mãe e pai de quem passou ou ainda está lá e nativos. Aos viçosenses que se revoltam com a distância entre o município e o meio acadêmico, digo que a questão merece uma discussão maior e mais séria. Mas a UFV não é, de longe, um problema para Viçosa. E a todos que escreveram de forma anônima, sinto apenas pela covardia. É direito de qualquer um gostar ou não de qualquer texto, qualquer lugar e qualquer pessoa. Mas esconder-se para se posicionar de forma contrária à maioria é uma pena e digno de total falta de credibilidade. De toda forma, os comentários aqui estarão sempre abertos. Inclusive aos anônimos.

Por fim, fui tido como alguém que “conhece poucos lugares”, que “precisa viajar mais”. Não vou entrar nesse mérito, mas, definitivamente, não é o caso. E se a interpretação de texto não é o forte da galera por aí, não me furto a fornecer explicações. Vamos lá. Definitivamente Viçosa não é o lugar mais bonito do mundo. Nem a UFV a melhor universidade. Arrisco-me a dizer que não existem boas cidades, faculdades e nem mesmo empresas. O que existem são pessoas. E as que eu tive a alegria de conhecer e conviver em Viçosa valeram por tudo. Foram, são e serão meus melhores amigos por toda a vida. E é por eles que eu gosto tanto daquela terra.

Se você não teve a mesma sorte que eu, escreva, pinte, cante ou fale sobre o seu lugar, as suas pessoas. Exalte a sua Viçosa! Mostre a todos que em algum lugar do mundo você se sente em casa. Quem sabe mais gente bacana resolve aparecer por lá pra abrilhantar ainda mais o seu local...

Valeu Viçosa, meu eterno vício.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Como o Corinthians venceu o melhor Brasileiro da história


Quando o juiz apitou o final do clássico entre Vasco e Flamengo, no Rio de Janeiro, o Pacaembu, em São Paulo, foi tomado por uma explosão de alegria. O Corinthians já era campeão brasileiro, acontecesse o que acontecesse. O principal troféu do futebol brasileiro voltou a ser corinthiano depois de seis anos, no campeonato mais disputado de todos os tempos.

O páreo entre Corinthians e Vasco foi sensacional. O time da Colina deu uma lição de profissionalismo a todos os outros ao, mesmo campeão da Copa do Brasil e garantido na Libertadores da América do próximo ano, lutar até o fim pelos títulos da Sulmericana e do Brasileirão. Ao contrário do que fizeram, por exemplo, o próprio Corinthians e o Santos nos dois últimos anos.

O Vasco tem um novo ídolo: o craque zagueiro Dedé. Diferenciado, defende, arma, faz gols. Já é um mito entre os cruzmaltinos e parte do crédito pelo excelente ano da equipe pode ser depositada na conta dele. E o time da faixa diagonal apostou em uma combinação sempre eficaz: juventude e experiência. Dois dos maiores ídolos da história estão de volta e jogando muita bola. Parabéns Juninho e Felipe, pelo físico, técnica e dedicação. E o elenco fechado para tentar dar o título ao treinador Ricardo Gomes foi demais.

O Corinthians montou um time pra ser campeão. Aliás, um não, dois. E aí é que foi feita a diferença. Em um campeonato longo, com 38 rodadas, o mais importante é ter grupo. A base é forte: Júlio César, Alessandro, Paulo André, Leandro Castán, Fábio Santos, Ralf, Paulinho, Alex, Emerson, Willian e Liédson. Mas, se precisar, vai de Danilo Fernandes, Welder, Chicão, Wallace, Ramon, Ramirez, Edenílson, Danilo, Morais, Jorge Henrique e Adriano. As peças de reposição são, em geral, de qualidade e deram conta do recado. Foi a vitória da coletividade. E a torcida, como sempre, fez o que cabe a ela: apoio irrestrito e incondicional.

Outro ponto importante foi manter o técnico Tite, que nunca esteve de bem com a torcida. Com a eliminação prematura na Libertadores, todos queriam a cabeça do comandante, mas a diretoria acertou em confiar no trabalho dele e deixar que ele montasse seu time. Em pouco tempo, o Corinthians chegou à final do Paulista, ainda com o time em formação, e viu o título ficar com o excelente Santos. O Santos que foi coadjuvante neste Brasileiro e só não passou despercebido porque o Neymar foi genial e, quando não estava convocado, estava em campo dando show Brasil afora.

A campanha do Fluminense foi bonita e o Fred é o cara. O Flamengo até que tentou bater de frente com os líderes, mas o time, como um todo, é limitado e depende dos lampejos de genialidade do Ronaldinho Gaúcho e Thiago Neves. O problema que o Flamengo fez festa para o Ronaldinho do Barcelona, mas trouxe mesmo o Ronaldinho do Milan. Altos e baixos, mas ainda assim fora de série. Só não o suficiente para carregar o grupo. O Inter tem time pra fazer mais do que fez. E, apesar do gosto amargo no final, São Paulo e Botafogo montaram boas equipes, mas pecaram demais dentro e fora de campo. O Figueirense não conseguiu nada, mas saiu por cima.

Do Palmeiras e do Grêmio há tempos não se espera muita coisa. O Atlético Mineiro outra vez teve como título a permanência na Série A. A vergonha do Brasileirão 2011 foi o Cruzeiro, com uma campanha pífia. De melhor time do país no começo do ano a virtual rebaixado nas últimas rodadas, fez muito feio. É hora de uma faxina geral na Toca da Raposa. De cima pra baixo.

“Como o Corinthians venceu o melhor Brasileiro da história” é, na verdade, a manchete de uma revista Placar do final de 1999, ano em que o troféu também terminou no Parque São Jorge. Mas a edição de 2011 foi, incomparavelmente, melhor. Disputa acirradíssima, times fortes e rodadas emocionantes. Oscilações na tabela todo o tempo. Em campo, desfile de craques como Dedé e Neymar, Ralf e Ronaldinho, Fred e Lucas, Leandro Damião, Loco Abreu e Montillo.

Para o Corinthians, foi especial. Montou um time pra ser campeão e foi. Com todos os méritos, brigando pela ponta do começo ao fim. Mas infelizmente o saldo do domingo é negativo para a nação alvinegra. O Corinthians tem uma taça a mais e um ídolo a menos. Um mito tão vencedor foi derrotado de vez pelo álcool. Esse jamais será esquecido. Punho direito cerrado erguido eternamente dentro dos nossos corações.

Descanse em paz, Doutor Sócrates.