segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O menino e a bola


O menino foi o último a ser escolhido, mas isso não era raro. No campinho tinha o número exato de garotos para uma partida, senão nem o deixariam jogar. O colega que perdeu o par ou ímpar reclamou que seu time ficaria mais fraco porque o menino estaria nele. Os outros argumentaram que sempre um lado fica um pouco melhor que o outro, não tem jeito.

Mandaram o menino ficar parado na frente, na banheira. E ele foi. Mas na primeira jogada perdeu a bola e acusaram-no de ter matado um contra-ataque. Olharam feio pra ele. Depois, recebeu a bola em boa posição, mas não conseguiu dominá-la e a jogada outra vez não surtiu efeito. Recebeu, em consequência, um xingamento pessoal cabeludo. Os que eram mais seus amigos o defenderam.

Mandaram o menino ficar parado atrás, fechando a zaga. E ele foi. Mas deu azar que de cara enfrentou o mais habilidoso da turma, que o driblou com facilidade, correu mais que ele e bateu cruzado, fazendo um golaço no cantinho para inaugurar o placar da pelada. Só um amigo do menino tocou em sua mão e o condecorou pela tentativa; ainda deu uma dica de marcação. O resto gritou com ele.

Mandaram o menino pro gol, pra atrapalhar menos. E ele foi. Mas, pra acabar de vez com qualquer chance de redenção, sofreu um gol debaixo das pernas logo depois de o placar ter ficado em 1 a 1. Nem foi tão culpa dele, a bola desviou na defesa e o surpreendeu. Mas ele foi condenado. Expulsaram o menino da brincadeira e um time ficou com um a menos. Foi embora mais cedo.

Mas o que ninguém sabia é que o menino, ainda bem criança, já era poeta. Tinha mil obras. Quando chegou em casa, pegou um lápis e o caderno e teceu um lindo poema sobre futebol. Nele, o menino batia na bola melhor que o Zico, driblava melhor que o Mané e fazia mais gols que o Pelé. Era o melhor do mundo.

4 comentários:

Maicou disse...

Um relato autobiográfico? hehe

Didi, por um instante achei que a história terminaria como um gol do garoto após seu amigo driblar todos os adversários, o goleiro, tocar para ela e dizer - "agora faz!". Na sequência acabaria a pelada...

hehe

Anônimo disse...

Achei que fosse estimular os leitores a torcer pelo improvável e jogar no final um balde de água fria. Que seria o inesperado, mas que no caso hoje eu já esperava, se é que me entende. rs

No entanto me dei mal. Conseguiu me surpreender com esse final que me fez lembrar do seriado Mundo da Lua.

Inclusive faz todo o sentido: Pelo visto por aqui tudo pode acontecer. =)

Cláudia disse...

Sabe,pouco joguei futebol,afinal as meninas, há algumas décadas, não podiam jogar futebol. Mas, se a história fosse sobre uma menina e um jogo de handball, eu diria que aquela era a história de Diva Latívia. Acho, um dia desses vou contar a minha experiência trágica, nas aulas de educação física...rs
Excelente texto, sensível, cativante. De novo: alegria imensa ter encontrado o seu blog.
Cláudia

Matheus Espíndola disse...

Baseado em fatos reais, tô ligado!