segunda-feira, 23 de março de 2009

Saudades de um cara 8

“Crescei-vos e multiplicai-vos”, sentenciou o Criador. O Lilli levou a sério.

Lillizinho e Lilli 3


O Lilli sempre foi um cara especial. O tipo de pessoa que agrada todo mundo, de quem todo mundo gosta. Entre suas características, uma chamava a atenção: a capacidade de reprodução. Como que por meiose, muitos outros Lillis cruzaram nosso caminho e receberam alcunhas de numerais cardinais — que seguiram mais ou menos a ordem em que os indivíduos apareceram e/ou o grau de similaridade física com exemplar original, o 1.

No entanto, dois deles se destacaram, sem ser dos magros com os cabelos negros cacheados. Eles chegaram a Viçosa e o destino cuidou de colocá-los na mesma república do Lilli — daí a fazer parte da turma foi um pulo.

O Lillizinho chegou comendo pelas beiradas. Era amigo do irmão mais novo do Lilli e, quando chegou a Viçosa, pediu abrigo ao compatriota do Norte mineiro. A bagagem do estudante restringia-se a seu Playstation 2 e um CD de Winning Eleven. Foi cedido a ele o estreito quartinho da casa, miúdo, que combinava com seu porte mínimo.

Lillizinho foi assim apelidado pela estrutura física mais jovial, quase infantil. Superdotado de inteligência, o pequeno gênio chegou à cidade universitária tímido, ainda conhecendo a adolescência, com espinhas em vez de barbas. A pele branca combinava com a careca — fruto do triunfo da aprovação nos exames para ingresso no ensino superior — e os óculos grossos que escondiam o olhar míope, configurando um aspecto de garoto retraído. Jovial, diminuto, mas de um companheirismo incrível, sem tamanho.

Aos poucos foi se soltando. Adotou tradições, participou ativamente dos eventos organizados pelos novos amigos e aprimorou técnicas de feições faciais relativas a Paulo Dimas de Oliveira. Aprendeu a falar espanhol na balada e acatou todo o código de ética Coala. No último dia de vida acadêmica de dois dos seus amigos comunicadores, foi fisgado no corredor do PVA e intimado a assistir à apresentação de trabalho de conclusão de curso que tratava de um projeto literário envolvendo glórias de clubes futebolísticos. Prontamente aceitou. Definitivamente havia se tornado um de nós.

Lilli 3 apareceu depois. Usava boné para trás, roupas e cabelos adolescentes. Chegou transferido da universidade de Diamantina — terra do melhor carnaval do mundo. Àquela altura existia diversos Lillis 2. Assim, naturalmente, assumiu — de forma exclusiva — o terceiro posto na hierarquia.

Jovem agradável, parceiro, divertido, sempre que podia estava com a equipe. Um belo vagabundo, diga-se de passagem. Ele e Lillizinho tornaram-se dois pequenos cavaleiros do poderoso Lilli 1, algo como os capangas de uma gangue do bem. Uma cena marcante ocorreu na biografia do grão-mestre da ordem lillítica, em que 3 e Zinho coroaram a amizade com os então formandos numa tarde de muitas histórias para a eternidade.

Lilli 1 nos proveu dois bons caras.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Intensive flashback 2

Originalmente escrito e publicado em abril de 2006.

Carnaval inesquecível

(Solteiro no Rio de Janeiro)

Por Matheus Espíndola


Bem que me disseram... a cidade é (de facto) maravilhosa.

Mais do que isso, me atrevo a afirmar que aquele papo de Pão de Açúcar, Corcovado, Garota de Ipanema, enfim... é tudo propaganda enganosa. Assim como essa conversa de tiroteio, assalto, e todos os outros mais cartões postais de que muito se fala por aí.

A grande magia da cidade maravilhosa mora na Vila dos Afonsos... um lugar abençoado, um paraíso em meio à natureza, um oásis de perfeição que se esconde pouco antes de chegar no engarrafamento.

Somado a isso, uma estadia saponácea no litoral. Momentos inesquecíveis de curtição, sol, surf, passeio de navio... e a visita à Ilha de Kubanacan. Sem falar das ilustríssimas companhias de John Lock, Tino, Guilhermino... e por aí vai.

Mas nada reacendeu o nosso espírito de Coala de maneira mais intensa do que aquele reencontro há tantos anos esperado... Sim, ele compareceu. Nosso saudoso e gigantesco amigo Afonso Coutinho. Como foi bom constatar que ele continua o mesmo... e como é inacreditável perceber que conseguimos viver tanto tempo sem ele.

Uma canção profunda embalou nossas férias, nos remetendo à mensagem de que um dia a gente há de ser feliz... Se Deus quiser. E no mais... dane-se o mundo, dane-se Ronaldo, Robinho, Shevchenko, Zidane. Dane-se tudo. Dane-se Canei!

Até o nosso próximo destino... Brasila! (Onde já somos eternos...)

Intensive flashback

Aproxima-se o dia em que os melhores caras do mundo se reencontrarão. A data em que reviverão o clima universitário que os embalou durante quatro longos anos, que, ao final das contas, passaram tão rápido. A reunião será em Mangaratiba, litoral fluminense explorado pioneiramente por parte da equipe há quase três anos. Relembremos a história em um documento por mim redigido e publicado no extinto blog Koalas.

Projeto Mangaratiba I


Um grupo de amigos. Uma expedição ao litoral fluminense. Lembranças eternas.

A primeira expedição Coala a terras semidesconhecidas atingiu o ápice do sucesso. Provamos que babaquice não tem idade, cor, tamanho, idioma, e agora, limites geográficos. Ulisses, Moicano, Maicou, Capô, Luiza e Camila, os grandes heróis dessa jornada ao lado da imprescindível e especialíssima presença ilustre do companheiro Fernandôncio.

Quarta-feira, 23h05 ou 23h07. Não se sabe exatamente qual ônibus tomamos. O que se sabe é que fizemos a viagem mais divertida em um ônibus honesto de toda a história das viagens interestaduais. Arlindo, Afonei, musiquinhas, peidos... Começávamos o projeto com o pé direito.

Contratempos aconteceram, mas só serviram para provar nossa força!

Maicou conseguiu provar que não é uma gripezinha, uma tosse, um resfriado, uma pneumonia, uma epidemia de dengue e nem a contração de AIDS que vai lhe derrubar assim tão fácil. Aguentou firme enquanto seus anticorpos lutavam com todas as forças contra as enfermidades. Foi o grande herói da expedição. Quando parecia estar sendo derrotado, colocou seus All-Star’s, pegou seu violão, tocou uma música dos Engenheiros e voltou a ser o velho Maicou.

Capô teve uma tarefa que não era das mais fáceis. Quase sofreu uma peça do destino. No primeiro dia de diversão, ao adentrar nos domínios do grande Oceano Atlântico caiu uma armadilha e torceu o pé. Era hora de mostrar que um velho lobo-do-mar como ele não se abalaria com uma simples fratura exposta na perna e que sua fiel pomada daria conta do recado. Dito e feito. Pouco tempo depois já estava ele de pé, dando um show na arte de pegar jacaré, assumindo o violão nos momentos de repouso do Maicou e se mostrando o rei da gastronomia litorânea. O mestre da panqueca na praia!

Já o Moicano foi atacado por um terrível entupimento de nariz. Nada que meia dúzia de comprimidinhos não resolvessem e o deixassem apto a fazer dúzias e mais dúzias de exercícios na praia ou a combater qualquer americano que atravessasse nosso caminho se atrevendo a construir um castelinho de areia melhor que o nosso. Ficou um pouco espantado com a falta de cordialidade das cariocas, mas no final, como sempre, garantiu o seu canei.

Luiza é nossa mais fiel companheira desde sempre. Tudo bem que se excedeu em alguns momentos, como no célebre caso em que irritou a todos repetindo insistentemente por horas e horas as frases “Na moral, véi. Os pais da Camila dão tudo pra gente. Na moral, a gente tem que sair daqui”. Mas isso a gente até releva. Teve o prazer de comemorar seu aniversário no parquinho da Vila dos Afonsos, num momento pós-show do Biquíni Cavadão e em meio a babacas, Afonei, violão e chuva. A típica virada de aniversário perfeita. E depois é a Luiza que é a lerda, depois é a Luiza que é a sonsa, a Luiza que é a lesada, a pateta.

Camila Morgado é simplesmente a responsável por tudo. Extremamente audaz ao liderar todo o bando, convidando-nos para sua residência litorânea. Mostrou-se uma digna herdeira da dinastia dos Afonsos. Um enjôo ou outro em alto mar, mas nada que uma filha do General João Afonso e da tia Cida não tire de letra. Obrigado por tudo, menina!

Quanto a mim, só digo que foram alguns dos melhores momentos de toda a minha vida! E os melhores em solo carioca.

E que reencontro! Os anos se passaram mas ele continua o mesmo. Fernando Coutinho, o nosso Afonso. O tempo passa, mas a negritude, o gigantismo e a incrível capacidade de retirar do fundo do baú as músicas mais esquecidas e trazê-las de novo à tona continuam intactos. Muitos não acreditarão, muitos não acreditam e muitos não acreditaram, mas por alguns momentos ele esteve conosco! E tocou uma música – por coincidência do Tianastácia – por horas. Momentos breves, mas que serão guardados com todo o carinho por toda a eternidade em nossos corações.

Um parágrafo especial a Tainá e Thamiris. Duas pessoas que contribuíram muito com o sucesso do projeto. Belíssimas anfitriãs. Meninas, vocês são foda! Conquistaram todo mundo, e considerem-se sempre bem-vindas a Viçosa sempre que puderem nos visitar.

Tia Cida e o General Afonso foram nossos pais por alguns dias. Estadia mais-que-perfeita. Hotel cinco estrelas, tratamento de gala. Tia Cida, uma típica mãezona. E o General mostrou que não é porque é um dos homens de maior prestígio na Aeronáutica nacional que não pode ser babaca e divertir em igualdade de condições com um bando de zés-ninguéns. Isso sem falar nas agradabilíssimas companhias da vovó, da família do Roberto, em especial seus grandes e promissores filhos John Locke e Roberto Tino, e de Tamba e Guilherme.

O primeiro projeto está concluído. Agora, depois do sucesso de Mangaratiba I, iniciemos os projetos Brasila II, Ibitipoca III, Ipatinga & Coronel Fabriciano IV, Buenos Aires V e Miami VI. E nunca esqueçam...

“Lãs de aço
Tem esponja
Panos multi-uso
Saponááááceos

Hoje é festa
Na casa e no apê
Usou, passou, limpou
É Assolan, fenômeno!”

E uma última homenagem ao estado que nos recebeu com tanto carinho....

“Rio de Janeiro
Rio de Janeiro cabeludo
Rio de Janeiro
Rio de Janeiro ensanguentado
E o meu cu
Meu cu
Ta cheio de Rio de Janeiro
Janeiro
Janeiro
Janeiro
Janeiro”

quinta-feira, 12 de março de 2009

Cenas do cotidiano 2

Imagem meramente ilustrativa

No restaurante barato, tarde de sábado de Carnaval, entra um sujeito estranho, feio, desengonçado, de chapéu, calça jeans e camiseta regata, com uma pilha de CDs piratas nas mãos.
– Querem olhar os CDs? É um por R$ 3 e dois por R$ 5!
– Não, obrigado.
– Por favor, compre um CD. Ainda não vendi nenhum e estou sem dinheiro até para almoçar.
– Deixe os discos aqui e peça uma marmita, da maior.
Rápida avaliação do material oferecido.
– Está explicado porque não vendeu nenhum. Só tem CDzinho ruim.
– ...

O rapaz volta.
– Obrigado!
– A marmita é R$ 7. Vou pegar mais um CD, tá?!
– Tudo bem, pode escolher.
Repassa todos os discos, um por um.
– Ah, pensando bem, não quero não. Muito ruinzinho. Pode ir.
– ...

terça-feira, 10 de março de 2009

O triunfo do Herói


O Fenômeno está de volta. Volta aos gramados, volta às manchetes, às conversas de boteco. Pela primeira vez atuando no futebol brasileiro depois de se tornar o Ronaldo — quando atuou pelo Cruzeiro Esporte Clube era apenas mais uma promessa como tantas outras —, o craque retornou ao país para vestir a consagrada camisa do Sport Club Corinthians Paulista. Recebeu uma enxurrada de críticas, claro.

O anticorinthianismo não é novidade no Brasil. Mas estender este sentimento ao jogador soa irracional. Brasileiro tem memória curta, isto é fato, mas atacar Ronaldo é como atacar o próprio país, desdenhar de um dos seus maiores heróis. Sim, o Ronaldo é um herói nacional. Foi dito como acabado para o futebol por três vezes e já se pode dizer que em todas elas deu a volta por cima. Se no Brasil houvesse honraria como, por exemplo, a de Cavaleiro da Rainha ou algo parecido, Ronaldo merecia ser o primeiro a ser coroado. Elevou o nome do país nos últimos anos e ensinou muita gente o que é determinação, força de vontade, o que é ser um guerreiro dos tempos modernos.

No primeiro amistoso do time no ano, contra o argentino Estudiantes de La Plata, o craque ainda não tinha condições físicas e não jogou, mas entrou em campo e saudou a Fiel. Segundo palavras do próprio jogador, em meio à pequena torcida dos hermanos, um rapaz, trajado com a camisa de um clube rival do seu novo time, gritou para ele em bom Português: “Ronaldo, você é uma vergonha para o Brasil”. Esta pessoa é digna não de ódio, mas de pena. Querer menosprezar a história de um ídolo nacional pelo simples e único fato de que a agremiação da qual é adepto não tem competência empresarial para contratar um reforço de tamanha importância é absurdo. O infeliz merecia prisão perpétua, umas boas chibatadas em praça pública ou um simples tapa na cara para aprender a respeitar uma pessoa de bem. Muito maior que o rapaz do insulto.

Ronaldo sempre foi exemplo dentro e fora de campo. Dentro, sagrou-se o maior artilheiro da história das Copas do Mundo, ganhou duas delas e foi artilheiro de uma, e por três vezes foi eleito o melhor jogador de futebol do ano. Fora de campo fez e faz campanhas beneficentes por onde passa e é embaixador de projetos sociais. Mais que isso, Ronaldo ensinou ao Brasil que é cada um quem define onde é seu limite e que a volta por cima sempre é possível, quer os outros concordem com você quanto a isso ou não. Assim vive o guerreiro. Uma lenda viva do esporte, o atleta em atividade no mundo com mais glórias para contar.

Quando o Fenômeno marcou o gol de empate no clássico contra o Palmeiras aos 47 minutos do segundo tempo — um dos gols mais importantes de sua extensa carreira —, Ronaldo começou a assinar seu nome da concorrida galeria de ídolos corinthianos, mas, mais que isso, contrariou as regras do futebol e provou que uma partida encerrada em um a um pode ter vencedor. O Corinthians não venceu, o Palmeiras não venceu, mas Ronaldo venceu, o Brasil venceu. A espera de mais de um ano no Departamento Médico, as cicatrizes no joelho, os dias de intenso treinamento pela manhã e tarde, tudo virou passado.

No clássico, Ronaldo precisou de meio meio-tempo para provar quem é o Fenômeno. Na primeira oportunidade em que tocou na bola, foi parado com falta. Na segunda, disparou um foguete no travessão e o destino só não deixou que ele marcasse o gol porque reservara a ele algo muito maior. Na tentativa seguinte passou pelo marcador e deixou a bola na cabeça do atacante, que não triunfou. Quando o tempo de jogo ameaçou acabar, a bola procurou seu mestre. Justo na cabeça, maior deficiência técnica do gênio da área. Gol. Redenção. Vitória do esporte.

Ele voltou. E talvez terá agora o maior desafio de sua vida. Nos últimos anos, entre clubes e Seleção Brasileira, o Fenômeno acostumou-se a olhar para o lado e ver Zidane, Romário, Figo, Kaká, Rivaldo, Beckham, Bebeto, Ronaldinho, Seedorf, Robinho. Agora verá atletas bastante limitados ou acéfalos como seu colega de posição Souza. Hora de vencer mais um desafio.

Gordo, com sobrepeso e sem ritmo de jogo, entrou no segundo tempo e mudou a história de um clássico. Imagine o que mais Ronaldo pode fazer quando voltar à condição física ideal. Um conselho? Nunca duvide de um herói, porque quando tudo leva a crer que ele vai se tombar, se levanta. Vence a batalha. E volta mais forte do que nunca.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Por Ulisses Vasconcellos

O ofício do Jornalismo é, sem dúvida, interessante. É gratificante retratar a vida de tantas pessoas diferentes. O ruim é quando o repórter se propõe a escrever um belo texto, assim o faz, mas não tem espaço no jornal e a matéria fica guardada para outra edição. E, de novo, não é publicada, até que fica velha e é descartada. Para isso, o legal é ter um plano B. B de blog.

Em Itaúnas o ritmo
do Carnaval é o forró
E AINDA TEM MAR, DUNA, RIO, TRONCO,
RAIZ, ARTESANATO, GENTE BONITA...

Ao contrário dos balneários de Guriri e Conceição da Barra, onde imperam o axé e a suingueira durante os dias de Carnaval, a Vila de Itaúnas continua a ser o paraíso dos forrozeiros. Os visitantes aguardavam a noite e a abertura das casas de shows para dançar, arrastar a sandália no chão, girar, mostrar todos os passinhos ensaiados o ano inteiro e bater coxa até o dia raiar.

A Vila atrai pessoas de todos os cantos do Brasil – a maioria, claro, para conhecer de perto os encantos do famoso forró. Outros, no entanto, se contentam em admirar as belezas naturais do rio, do marzão, das dunas... Ou acham a coisa mais divertida do mundo tirar fotos no enorme tronco de pequi-vinagreiro da praça ou na nem um pouco menos imponente raiz de jaqueira. Tem também o pessoal que só quer conhecer gente bonita e se divertir, e, para isso, uma rodinha de violão no meio da madrugada na levada de um samba-rock caiu muito bem.

O artesanato também atraiu a atenção, com peças e adornos corporais para todos os estilos e bolsos. Cordões e brincos dividiram espaço nas barraquinhas com obras de arte como aranhas e escorpiões montados com metal e desenhos em tábuas feitos com aerógrafo retratando figuras como Luiz Gonzaga, Cartola, John Lennon e Zeca Pagodinho. Isso sem falar na simpatia dos artesãos, que, com a maior paciência, explicavam aos turistas as técnicas que utilizam nos produtos que apresentavam, muitas vezes sem se forçar à formalidade de se levantar da rede para a boa conversa.

SONHO REALIZADO
Para completar o clima, o forró foi tocado por bandas de renome entre os adeptos do estilo. No domingo de Carnaval, os trios Sabiá e Nordestino comandaram a zabumba, a sanfona e o triângulo no Buraco do Tatu. Entre os muitos visitantes, estava o casal de namorados João Paulo Ribeiro e Gisele Gonçalves. Eles vieram de Juiz de Fora-MG dançar forró na Vila e disseram que realizaram um sonho. “Há cinco anos eu planejava vir a Itaúnas, mas ainda não tinha conseguido. Realmente é bom demais. Isso aqui que é forró” – declarou o forrozeiro. Ele se prometeu: ainda vai voltar.


Forró no Buraco do Tatu

Bate-coxa até o Sol raiar

Raiz de jaqueira

Tronco de pequi-vinagreiro

Escorpião de metal

Desenhos com aerógrafo

Nascer do Sol na praia



sexta-feira, 6 de março de 2009

Em busca de um ídolo — Bônus

Em busca de um ídolo — Bônus

Por Matheus Espindola


E digo mais. Como única testemunha de carne e osso da história, contribuo com alguns depoimentos complementares:

1. Elias dissera que estudava na UFV! Mas nunca foi visto por aquelas bandas. Talvez morasse, de fato, no céu...

2. Foi a primeira e única vez que tomamos cerveja com canudinho e segurando a lata com um guadanapo.
Nota do editor: A cerveja era Itaipava, latão de 473 ml, algo pouquíssimas vezes visto na balada.

3. Literalmente, só nós curtimos o rodeio!

4. Por alguns instantes, tememos que o Buchecha não comparecesse. Mas, enfim, havíamos feito a nossa parte...

5. Houve uma briga generalizada, após o show, e, tamanho era nossa gratidão e sentimento de solidariedade, chegamos a acudir uma menina que caminhava com o auxílio de muletas.

6. O anjinho que nos deu cerca de 40 centavos estava, sexta para sábado, em plena madrugada, na rodoviária, de mochila. Sem noção isso!

7. Na rodoviária havia um espelho, na parede, enorme. Quando olhamos nosso reflexo, pela manhã, rachamos de rir do formato da nossa coluna vertebral!

Em busca de um ídolo 4

Capítulo 4 — A van


Só Love. Conquista. Meu compromisso. Coisa de Cinema. Luminosa. Quero te encontrar. Fico assim sem você. O Nosso Sonho, realizado.

Findo o espetáculo, hora de ir para casa. Mas como? Cano sugeriu dormirmos por lá mesmo, no parque, e pensarmos melhor ao acordar. Eu sustentei que o melhor era ir ao estacionamento, onde, certamente, alguma alma bondosa se solidarizaria com nossa causa e nos ofereceria transporte. Ninguém se prestou a isso, claro. Até que vimos, ao longe, uma van com a porta entreaberta.

Com ar seguro, adentramos no veículo e tomamos nossos lugares, sem nem ao menos saber qual era o trajeto. Lá, descobrimos que o carro iria até Rio Branco e, com as bênçãos do velhinho motorista, acertamos nosso pagamento e deixamos Guiricema, em outra viagem de aventuras.

De novo na rodoviária rio-branquense, constatamos que o próximo ônibus com destino a Viçosa sairia dali a algumas horas. Contamos nossas economias e nos demos conta de que não tínhamos o suficiente para voltar — faltavam alguns centavos. Neste momento, um garoto cruzou a silenciosa madrugada da rodoviária, com materiais escolares a tiracolo e jeito de quem rumava a uma biblioteca — e era noite de sexta para sábado. Solicitamos, no estilo pidão mesmo, o valor que nos faltava e fomos prontamente atendidos pelo simpático menor. Então peguei no sono e desabei sobre uma mesa — sonhando com o Príncipe Buchecha e a odisséia que estava prestes a terminar.

Um sussurro nos acordou. Era um simpático homem mais velho, que nos questionava se iríamos para Viçosa. Tentando colocar as idéias no lugar e não aparentar tanto sono, cansaço e ressaca, balançamos a cabeça afirmativamente, enquanto travávamos uma luta com as pálpebras que se negavam a abrir. Ele se desculpou pela intromissão e orientou-nos a pegar um ônibus em que o horário de partida não estava no itinerário que tomamos como referência, mas saía mais cedo que os demais. Agradecemos. Em poucos instantes o coletivo chegou.

Já no ônibus nos demos conta de que não havíamos visto Elias na festa e nossos olhos e mentes se abriram: estivemos diante de um anjo, enviado dos céus para ajudar-nos a chegar ao nosso destino. Não só ele: o garoto das moedinhas, o senhor despertador, os arcanjos Coxinha e Totó Bola, o divertido mentiroso... Todos eram seres fantásticos, que se materializaram no intuito de nos proteger. Ficamos em silêncio, refletindo quão especial tinha sido nossa noite.

Na manhã de sábado estávamos de volta. Com o coração leve e feliz, de quem acabara de viver a mais mística de todas as aventuras do mundo real em busca de um ídolo.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Em busca de um ídolo 3

Capítulo 3 — A caminhonete


Elias mostrou-se pensativo, coçou o fino queixo sem
barbas e refez a proposta: “Querem ir na carroceria?”. Analisamos os riscos: não conhecíamos o motorista, nem o carro, estava de noite e a estrada era mal-asfaltada e mal-iluminada.

Aceitamos.

Elias apossou-se do banco do carona e eu, Cano e um outro cara que apareceu subitamente subimos à parte aberta da caminhonete. O companheiro da vez resolveu contar histórias de sedução bem-sucedidas, que, claro, não correspondiam à verdade. Entramos na brincadeira e as fortes rajadas de vento na cabeça durante vários quilômetros foram quase imperceptíveis em meio à gostosa conversa que retratava, em detalhes, situações que o mundo jamais conheceu.

A festa não era em Guiricema e sim no Parque de Exposições de Guricema — diferença acentuada quando não se tem carro próprio. Mas Elias tratou de resolver também esta questão e nos deixou em frente ao parque, com relativa antecedência à hora do show. Depois partiu, afirmando que se aprontaria e em breve nos veríamos na festa. Desde então ninguém tem notícias dele.

Estávamos adiantados, com tempo suficiente para uma e outra rodada de aguardente, um papo-cabeça, animamos o rodeio — fomos os únicos que responderam e deram moral ao locutor. Antes do show começar, partimos para perto do palco. O sentimento de sobrevivência dizia que precisávamos de amigos para permanecermos durante todo o show onde queríamos — os primeiros da multidão de fãs, os mais próximos do ídolo. Fizemos novos amigos, dois funkeiros inesquecíveis. Conhecemos, assim, Coxinha e Totó Bola, parceiros que curtiram o show ao nosso lado, nos dando a segurança necessária em meio ao mundo de caras grandes, mal encarados, de blusas largas, bonés retos e bigodes grossos. Todos do bem.

Veio o Buchecha. Como um moleque, saltou, cantou, brincou. Eu e Cano só desgrudávamos os olhos dele para ver se ainda estávamos em terreno seguro ou para tentar dizer um ao outro (sem conseguir fazer sair a voz, com lágrimas prontas a rolar): “Nós conseguimos. Nós conseguimos”. Nós conseguimos!

quarta-feira, 4 de março de 2009

Em busca de um ídolo 2

Capítulo 2 — O cartaz


Mais cedo havíamos nos informado sobre os horários de ônibus: era impossível chegar a Guiricema partindo no início da noite, já que o veículo que deixava Viçosa rumo a Visconde do Rio Branco neste horário ganhava a estrada quando o último coletivo de Rio Branco a Guiricema já deixara a outra cidade. Enquanto retornávamos ao núcleo urbano, dessa vez a pé e no escuro, mil coisas se passavam em nossa imaginação — mas a imagem mais forte, sem dúvida, era de um Buchecha animado, fazendo a típica dancinha bizarra (com uma mão no nariz enquanto balança o outro braço) que o consagrara. A esperança de ver o ídolo, no entanto, se esvaía lentamente, como a impiedosa descida das areias de uma ampulheta.

Questionamos pela milionésima vez o rapaz do guichê, na vã expectativa de que ele nos surpreendesse dizendo que a empresa acabara de notar a excelente oportunidade de obter um montante astronômico de lucros e decidido disponibilizar carros-extras até o show. Lembramos que, poucos meses antes, os garotos dos Los Hermanos haviam tocado em Ouro Preto e dúzias de vans e ônibus transportaram centenas de pessoas até a cidade histórica. Amaldiçoamos a indústria cultural.

A única opção era viajar até Visconde do Rio Branco no ônibus que partiria em poucos minutos e, de lá, de nos virarmos. Caso desse errado, precisaríamos aguardar até a manhã do dia seguinte para o retorno à cidade universitária. Risco demais. Não tinha mais jeito, o lance era aceitar a derrota, lembrar que tentamos e deixar a rodoviária. Não queríamos sucumbir. Pedimos mais um único sinal, que definiria o fracasso ou a persistência naquela empreitada.

Eis que, como que por encanto, olhamos para o nosso lado, literalmente, e, a um metro de distância, afixado na parede da rodoviária havia um cartaz da tal Festa da Cidade de Guiricema e, estampado em seu centro junto a artistas de menor renome nacional, ele — Mc Buchecha. Com o maior sorriso do mundo, a imagem nos convidava: sigam em frente!

Decidimos. Entramos na fila para adquirir os bilhetes rodoviários, e, daí em diante, a sorte nos sorriu. Debatíamos o que faríamos ao chegar em Rio Branco quando fomos interpelados pelo sujeito que aguardava sua vez à nossa frente — um jovem com cerca da nossa idade, feições serenas, traços leves, corpo um tanto rechonchudo, os cabelos tendendo para um lado sobre a testa e um par de óculos sinceros. Com tom agradável, interveio: “Estão indo para Guiricema? Eu também, e meu colega me buscará de carro em Visconde do Rio Branco. Desde que ele não apareça com a caminhonete, levo vocês até lá!”. Os vocábulos soaram como a mais perfeita melodia já composta em todos os tempos.

No ônibus, o novo amigo sentou-se em uma extremidade enquanto nós nos dispusemos em outra. Estávamos alegres, contávamos histórias, refletíamos o futuro profissional, que, àquela época, nos parecia tão longe. Percebemos então que, tamanha tinha sido nossa surpresa com a proposta do rapaz, que não havíamos lhe perguntado o nome. Mas tudo indicava que seria um nome ao mesmo tempo doce e forte, seguro e acolhedor. Puro e prestativo, angelical e terreno. Assim, convencionamos chamá-lo Elias.

Quando o ônibus estacionou no destino, eu pensava em ver qualquer coisa à minha frente, menos... ah não, a caminhonete! Como numa peça ardilosamente arquitetada, o destino quis que o amigo de Elias escolhesse justamente o veículo que, como combinado, nos deixava a ver navios.

terça-feira, 3 de março de 2009

Em busca de um ídolo

Dizem que no Brasil o ano só começa depois do Carnaval. É mais ou menos isso mesmo, pelo menos pelas bandas do litoral capixaba. Desde o Réveillon, em Guriri toda sexta-feira, sábado e domingo teve trio elétrico, com bandas de axé, pagode e forró. Nos dias de fato de Carnaval, o lugar lotou. Meu verão foi animado — mas talvez isso seja assunto para outra hora, outro post.

Agora que as coisas se acalmaram, retorno minhas atenções ao Issoqueeufalei. Vou enfatizar as seções Saudades de um cara, Por Ulisses Vasconcellos (com republicação de textos profissionais) e Cenas do Cotidiano, por sugestão de meu ilustre amigo Ré. Contudo, para a primeira postagem do ano, decidi realizar um antigo projeto e transformei em letras o Em busca de um ídolo, que será apresentado em quatro capítulos.

Capítulo 1 — O comercial


Era uma das metas a que eu e meu amigo Moicano tínhamos nos proposto a cumprir antes de receber o diploma de graduação universitária e deixar Viçosa para sempre: assistir a um show do Mc Buchecha. Num fim de tarde despretensioso de inverno eu assistia TV em casa, recuperando minhas forças para mais dias de intenso estudo. De repente uma propaganda me atraiu a atenção. “Festa da Cidade de Guiricema. Dia tal, não sei quem; dia tal, não sei quem; e dia taaal, Buuuchecha” – anunciou, eufórico, o narrador, como se estivesse à minha frente, piscando um olho para mim e dizendo: “Vai que é tua, garoto!”.

Falei com o Cano, que, prontamente, acatou a ideia de participarmos do evento. O próximo passo foi lembrar que dia da semana era o show e descobrir onde era a tal Guiricema. Fizemos busca online e, no domínio oficial do Mc na internet, deparei-me, no submenu Agenda, com a inscrição “Sexta-feira — Guiricema (A confirmar)”. Esta maldita ressalva entre parênteses nos fez perder o sono e pensar em desistir. Mas ainda não, era cedo demais. Puxamos pela memória e recordamos que nosso companheiro Lilli 1, certa vez havia se envolvido com uma mocinha da cidade em que pretendíamos aportar.

Saímos à caça dela dia e noite — e a encontramos no diversificado e excêntrico Bar Saliva’s, em meio a uma noite de curtição jovial. Ela nos confirmou a grande atração do funk em sua terra natal, contudo revelou não gostar do estilo e declarou que sequer daria as caras na festa. “Mandou mal”, pensamos, enquanto ouvíamos detalhadamente as indicações de que conduções deveríamos nos valer para nos dirigirmos ao palco em que realizaríamos nosso sonho. A moça também nos repassou alguns contatos que poderiam nos ser úteis — ela era filha do prefeito. É certo que nenhum dos telefones jamais atendeu, mas inflamos o espírito de esperanças. Assim, decidimos: iríamos mesmo ao show do Príncipe Negro.

Na hora combinada, na sexta-feira, eu e meu maior parceiro de aventuras nos encontramos, tomamos um ônibus municipal e partimos para a rodovia. Nosso destino inicial: a entrada da cidade, de onde, segundo o plano desenvolvido, pegaríamos rápido uma carona até Visconde do Rio Branco, onde pensaríamos as próximas etapas estratégicas. Passou um carro e não parou. Passou outro. Outro. Até que um parou, mas não foi para a gente, e levou outro pessoal que suplicava transporte. A cena se repetiu infinitas vezes, até que o Sol jazeu e o crepúsculo noturno coloriu o firmamento. Aos poucos toda espécie de mochileiros encontrou um ombro-amigo motorizado e sobramos apenas nós dois no perigoso asfalto intermunicipal. Entreolhamo-nos, indecisos, prestes a esboçarmos as primeiras palavras de fraqueza e cogitar a hipótese do retorno ao lar com o rabo entre as pernas.

Eis que os céus mandaram um sinal: deveríamos permanecer. Um coletivo particular passou lentamente e, em seu dorso, observamos, grafado em letras garrafais: “Claudinho Turismo”. Sim, o quase-irmão de Buchecha, peça fundamental em alçar a dupla ao sucesso no cenário nacional, falecido anos antes, tratara de nos encorajar. A saga persistia. O ônibus também não parou, mas nos fez partir para um imediato plano B: recorrer à rodoviária em busca de uma combinação de carros até a distante Guiricema.