quinta-feira, 5 de março de 2009

Em busca de um ídolo 3

Capítulo 3 — A caminhonete


Elias mostrou-se pensativo, coçou o fino queixo sem
barbas e refez a proposta: “Querem ir na carroceria?”. Analisamos os riscos: não conhecíamos o motorista, nem o carro, estava de noite e a estrada era mal-asfaltada e mal-iluminada.

Aceitamos.

Elias apossou-se do banco do carona e eu, Cano e um outro cara que apareceu subitamente subimos à parte aberta da caminhonete. O companheiro da vez resolveu contar histórias de sedução bem-sucedidas, que, claro, não correspondiam à verdade. Entramos na brincadeira e as fortes rajadas de vento na cabeça durante vários quilômetros foram quase imperceptíveis em meio à gostosa conversa que retratava, em detalhes, situações que o mundo jamais conheceu.

A festa não era em Guiricema e sim no Parque de Exposições de Guricema — diferença acentuada quando não se tem carro próprio. Mas Elias tratou de resolver também esta questão e nos deixou em frente ao parque, com relativa antecedência à hora do show. Depois partiu, afirmando que se aprontaria e em breve nos veríamos na festa. Desde então ninguém tem notícias dele.

Estávamos adiantados, com tempo suficiente para uma e outra rodada de aguardente, um papo-cabeça, animamos o rodeio — fomos os únicos que responderam e deram moral ao locutor. Antes do show começar, partimos para perto do palco. O sentimento de sobrevivência dizia que precisávamos de amigos para permanecermos durante todo o show onde queríamos — os primeiros da multidão de fãs, os mais próximos do ídolo. Fizemos novos amigos, dois funkeiros inesquecíveis. Conhecemos, assim, Coxinha e Totó Bola, parceiros que curtiram o show ao nosso lado, nos dando a segurança necessária em meio ao mundo de caras grandes, mal encarados, de blusas largas, bonés retos e bigodes grossos. Todos do bem.

Veio o Buchecha. Como um moleque, saltou, cantou, brincou. Eu e Cano só desgrudávamos os olhos dele para ver se ainda estávamos em terreno seguro ou para tentar dizer um ao outro (sem conseguir fazer sair a voz, com lágrimas prontas a rolar): “Nós conseguimos. Nós conseguimos”. Nós conseguimos!

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