domingo, 12 de dezembro de 2010

Respostofobia


Rubens era um sujeito do bem. Alto, moreno, cabelo curto, óculos de grau e roupas sociais. Trabalhador, organizado, disciplinado, se dava bem com todos na repartição. Era reservado, caseiro, não era muito de sair. Nunca ninguém o vira nervoso ou falando alto. No trabalho, estava sempre disposto a ajudar quem precisasse, sem esperar nada em troca. Mas padecia de um estranho e raro mal: era averso a respostas. Não se sabia ao certo por que, se por indecisão, vergonha ou desinteresse, o fato é que arrancar qualquer resposta que envolvesse sua vida pessoal era bem difícil, para não dizer impossível.

Vira e mexe, o assunto era o Rubens. O pessoal da repartição especulava quando teria começado essa esquisitice. O Silveira apostava ter sido na pré-escola, quando a mãe do então pequeno Rubinho o questionara se ele preferiria uma lancheira do Hulk ou do Homem-Aranha. Ele, sem ter certeza se queria ser forte ou ágil, não respondeu e surtou. O Otávio acreditava que foi por volta dos dez anos, quando teria sido convidado por duas amigas para dançar quadrilha na festa junina do colégio. Indeciso entre a loira e morena, calou-se e nem dançou. A Maria Antônia botava as fichas na hipótese de que Rubens fora normal até o fim da adolescência, mas entre optar pelo vestibular de Direito ou Medicina, parou no ensino médio.

O que todos sabiam é que o colega tivera três merecidas oportunidades de promoção. E sequer respondeu a qualquer uma delas. Na primeira, o diretor regional ficou magoado com o que considerou um pouco caso de um funcionário tão estimável, mas foi alertado pela secretária de que o Rubens era assim mesmo. Não respondia se iria à festa de fim de ano, não colocava o nome da lista do amigo oculto nem da vaquinha para o presente de casamento dos colegas. Mas sempre ia ao restaurante marcado para a confraternização da repartição e geralmente comprava ele próprio um presente para o casal de noivos. Da segunda oportunidade de ascensão profissional para o Rubens, o diretor entendeu o que estava acontecendo. E da terceira e última, teve certeza de que o caso dele era mesmo grave e decidiu parar de tentar mudar o rapaz.

O office-boy Juninho um dia voltou do banco com uma história de que o Rubens, antes de trabalhar com eles, fora noivo. Ficou sabendo que a moça, depois de anos de espera para o casório, decidiu adiantar as coisas. Marcou um jantar num restaurante chique, comprou as alianças e o pediu em casamento. Ele suou frio, postergou a resposta e nunca mais a procurou. Nem atendeu ao telefone, não respondeu as mensagens de celular. Nem aos e-mails. Nem namorou de novo.

De vez em quando alguém ligava para a repartição para saber se ele estava bem. No meio do ano, Rubens fez um curso de reciclagem com funcionários de toda a regional. O pessoal se amarrou no jeitão dele e tentou manter contato. Ele, claro, não respondeu nenhum e-mail. E lá ia outra vez a telefonista explicar que estava tudo certo sim, ele provavelmente lera os e-mails, mas não ia mesmo se manifestar. Não, ele não ficou chateado com nada que ninguém falou, é o jeito dele. Outra ligação, de um antigo colega de escola. Sim, o Rubens ainda trabalha aqui e pode confirmar o nome dele pro reencontro do fim de semana que ele vai sim.

Depois de anos de convivência, ainda era um tabu para qualquer colega tocar no assunto com ele. Rubens desconversava, inventava um compromisso e saía pela tangente. Sugeriram que ele conversasse com um psicólogo, mas ele não respondeu à proposta. E ficou por isso mesmo. Quando ele se aposentou, todo mundo sentiu falta do altão esquisito que não respondia a ninguém. Com 96 anos, Seu Rubens mora sozinho em um apartamento no Centro. A saúde está frágil, já teve dois derrames e uma parada cardíaca. A Morte já o chamou outras três vezes. Mas ele não responde.

domingo, 21 de novembro de 2010

Crônica bancária 6


- Eu quero trocar minhas senhas, a de números e as letrinhas.

- Pois não, senhora.. Pode digitar a nova senha aqui no teclado.

******

- Mais uma vez, pra confirmar.

******

- Está alterada. Vou cancelar a senha de letras agora... Pronto. Mas esta não tem como escolher a nova, vai sair impressa no caixa eletrônico lá fora.

- Nossa! Então deixa eu correr lá antes que alguém pegue o papelzinho antes de mim. Brigada, viu?! Tchau.

- ....

sábado, 6 de novembro de 2010

Crônica bancária 5


A cliente realmente parecia honesta. Uma jovem senhora, com vestido fechado. Simpática, sem maquiagem, cabelo preso.

- Eu queria saber se eu posso ter cartão de crédito.

- Claro, todo mundo pode. Desde que não tenha nenhuma restrição no nome. Mas isso eu consulto agora e... É, a senhora tem um problema. Tem uma restrição registrada no seu nome no SPC pelo... deixa eu ver... Mercado do Zequinha.

Cara de quem já esperava pelo pior. Feição mista de tristeza e indignação. Silêncio e umas duas balançadas de cabeça com o olhar desviado para o lado. A réplica:

- Esse Zequinha é meu ex-marido! Ele me falou mesmo que se eu me separasse dele, ele iria sujar meu nome. Aproveitou que tinha uns papéis que eu assinei com ele e fez isso. Mas agora eu vou atrás dos meus direitos. Sacanagem demais, não é?!

Nenhuma resposta, só uma breve levantada de sobrancelhas, como que manifestando plena concordância com a indignação da senhora. Mas em brigas de (ex-)marido e mulher, não se mete a colher.


Bônus (+18)

No autoatendimento, um funcionário auxilia as pessoas que não se dão bem com a tecnologia e os idosos que a longevidade da vida lhes tirou algumas virtudes físicas. Como a visão.

Entra, a passos lentos, um velhinho, desses de óculos fundo de garrafa e que resmungam todo o tempo, mesmo em silêncio.

- Meu filho, vê meu saldo aí pra mim.

- Pois não. Seu cartão, por favor. Agora digite sua senha de sílabas na tela.

- Ummmm. Ummmm. Não consigo achar. Tô ruim das cataratas, não enxergo mais nada. Bate aí pra mim. A primeira é bu.

E enquanto o funcionário prepara-se para selecionar na máquina, o velho chega a seus ouvidos e, balbuciando, diz em volume nada discreto:

- Bu de buc*ta!

- Já ouvi, senhor. Agora a segunda sílaba. Espertão...

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O último dia


Já sentiu a sensação de ter a consciência pesada sem saber exatamente por quê? É assim que eu me sinto agora. Hoje tudo está diferente, tudo mudou.

Desde que eu estabeleci minha rotina, os dias vinham sendo exatamente iguais. Até ontem.

Eu sei que por eu ser um cão de rua, nem todo mundo gosta de mim. Já gritaram comigo, me xingaram alto sem eu ter feito nada e um cara uma vez me jogou um chinelo velho. Normal, é a sina dos cachorros vadios. Mas eu tenho amigos, muitos! Pelo menos jurava que tinha.

Acho que já fiz dois ou três meses de vida. Não tenho a menor ideia de quem possa ser meu pai e da minha mãe não me lembro mais. Eu ainda era muito filhote a última vez em que a vi. Ela sumiu. Recordo-me de ter irmãos, um monte, mas nem sei ao certo quantos somos.

Desde que me dei conta de que estava sozinho no mundo, dei meu jeito de sobreviver. Bebia água em poças, comia restinhos de lanches. Sou esperto, acho que devo ter algum antepassado cão de caça. Aliás, nem sei se tenho raça. Gosto de pensar que meu pai é um cachorro de caça e minha mãe descende dos pastores. Eu poderia ter um avô daqueles cães magrelinhos, que correm muito. E uma avó dessas que parecem um bichinho de pelúcia. A verdade é que eu não passo de um vira-lata. Sozinho.

Minha vida mudou o dia em que eu, andando sem rumo, parei em frente a esta faculdade. O tanto de gente me deixou com um pouco com medo. Mas fui muito bem recebido. Ganhei comida e até uns cafunés. Desde então, venho aqui todos os dias nesse horário e me tratam como um rei. Já comi biscoito Passatempo, Fandangos, pedaço de torta de frango com catupiry (essa eu adoro) e até picolé de limão. Um dia me deram um banho, na hora eu não gostei, mas o cheirinho bom fez sucesso. Tenho vários nomes. Cada turma me deu uma alcunha diferente. Eu nem ligo, adoro todos meus amigos.

Aos sábados, o movimento diminui. Mas sempre vem alguém trocar uma ideia comigo, jogar alguma coisa pra eu pegar e trazer de volta em troca de um afago e uns bicoitinhos. Domingo eu não venho, fico na praça em frente à igreja. E nas segundas, abano o rabo de felicidade quando reencontro a moçada.

Enquanto lembro-me disso tudo, olho para todos os lados procurando meus amigos e o que vejo é só o vazio. Está na hora em que nos vemos todos os dias. Mas hoje não veio ninguém. Acho que não gostam mais de mim. Eu devo ter feito alguma coisa que magoou a todos eles. Juro que não sei o quê. Será eles me acham pidão demais? Será que arrumaram outro vira-lata de estimação? Será que eu lambi alguém onde não devia e eles combinaram de não falar mais comigo?

Vou embora. Pra sempre. De cabeça baixa. Gostava de verdade daqui. Desculpem-me qualquer coisa.



Minutos depois o grande portão de metal foi aberto e uma multidão de jovens de mochilas saiu do prédio. Estranharam a ausência do cachorrinho. Procuraram pelas ruas do bairro. Questionaram-se o que poderia ter acontecido a ele. Pensaram no pior e fizeram um enterro simbólico do pacote de ração que haviam comprado para o cão por meio de uma vaquinha e seria entregue hoje. Nunca mais o viram. E ele jamais entenderia o que é o horário de verão.


Inspirado em uma foto de um cão vadio na UFV postada por Régis André no Twitter.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Crônica bancária 4


- Boa tarde. Em que eu posso te ajudar?

- Quero abrir uma conta.

- Você trouxe todos os documentos? Identidade, CPF, comprovante de residência.

- Sim. Eu já tinha até vindo outro dia, mas não deu pra abrir porque a conta de luz não tava no meu nome.

- Quando é assim, precisa de uma declaração da pessoa de que você mora neste endereço.

- Hoje eu trouxe; meu marido fez pra mim.

Abre uma folha de caderno com linhas vermelhas dobrada em quatro e entrega. Uma frase escrita com letra garranchosa.

“Eu, Rogério, declaro que a conta de luz está em meu nome”.

Ah bom, agora sim...

domingo, 3 de outubro de 2010

O mesmo lugar


Faz parte da vida de todo estudante de graduação almoçar no Restaurante Universitário da instituição dele, nem que seja quando a remessa de dinheiro vinda dos pais diminui, nem que seja por um único dia, nem que seja só para depois falar mal da comida. Mas não foi assim com aquele grupo de então jovens graduandos da Universidade Federal de Viçosa – durante quatro anos eles se reuniram sagrada e alegremente no mesmo local para realizar suas refeições. Duas vezes por dia.

O almoço não era lá o melhor manjar que se poderia oferecer aos deuses greco-romanos. Também é certo que o arroz e o feijão não carregavam um tempero digno da cozinha de Dona Benta e Tia Anastácia. Os vegetais, às vezes, não tinham qualquer cor. Ou gosto. Mas, verdade seja dita, de uma maneira geral, a refeição era de bom gosto e supria satisfatoriamente as necessidades calóricas de um jovem em fase final de crescimento vertical e princípio de crescimento horizontal.


O jantar, esse sim merece elogios. Pães, frutas, suco e doce ornamentavam e envolviam o recipiente do bandejão que receberia a deliciosa e nutritiva sopa do fim da tarde. Ao longe, o odor agradável tratava de abrir o apetite e preparar o estômago para receber o divino caldo de legumes, batatas, lentilhas, canjiquinha ou, às sextas-feiras, o que sobrara do almoço da semana.

Nos dois horários, as refeições sempre tinham algo especial em comum. Além do grupo de amigos e das boas histórias e risadas, o mesmo lugar: a mesma mesa. Na UFV, o RU é dividido em dois. O da esquerda é todo fechado por paredes de concreto, o que cria certo clima de opressão e, por isso, deveria ser evitado a qualquer custo. O da direita não, é todo de vidro. Sua opacidade permite, enquanto a refeição é consumida, a contemplação do canto dos pássaros nas árvores, cachorrinhos na calçada suplicando parte do frango, o lento passar daquela paquera do outro período. E no RU da direita, os estudantes se encontravam, invariavelmente, na mesa ao lado das duas quinas de paredes de vidro.

Caso um deles fosse comer sozinho, o ritual já estaria traçado: entrar, pegar a bandeja e caminhar até a mesa, transpassando toda a diagonal do restaurante. Se outro do grupo estivesse no restaurante, já haveria de ter tomado o ponto de encontro, no aguardo dos demais. E dos demais, que certamente ainda viriam. Era a mesa mais longe da roleta de entrada, mais longe de onde se servia a comida. Aparentemente não havia razão para tamanha predileção. Aparentemente. A mesa era mais perto dos pássaros, das árvores, dos cães. De fazer com que aquele almoço em família – a família que a gente escolhe – fosse mais do que a hora de comer. O momento de reforçar, cada dia mais, a amizade firmada. Quatro anos.

Depois de formados, a mesa continuou sendo utilizada pelas gerações mais jovens daquela turma. E, aos antigos, receber uma mensagem no celular ao meio-dia revelando que um deles ainda almoçava na mesa era motivo de orgulho. A tradição fora passada adiante. Em caso de uma rápida visita a Viçosa, o RU tinha que ser revisto. Mais um almoço, naquela mesa. Mesa do vidro. A própria mesa.

Se algum dia alguém daquele grupo virar pirata e precisar esconder um tesouro embaixo de alguma coisa, acho que sei onde encontrar.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Crônica bancária 3


O visor e o som característico chamam a próxima senha para a mesa de atendimento do banco. Vem um jovem negro, forte, de cavanhaque. Quer abrir uma conta. Seus documentos, por favor.

Rápida conferida.

- Seu nome se pronuncia assim mesmo... Marterflay?! (Como se existisse alguma forma correta de pronunciar isso.)

- É.

- Quem inventou esse nome?

- Minha mãe.

- Como? De onde ela tirou?

- Copiou de um parente. Achou bonito (sei lá, não colou).

(...)

- Pronto, a conta tá aberta. Agora é só você assinar estes papéis aqui pra mim.

- Tá.

Começa a escrever.

- Tem dois erres?

- O quê?

- Meu nome.

- Tem não, Marterflay. Um só. Ainda bem.

sábado, 18 de setembro de 2010

Tratado sobre Maicou


A sociedade é repleta de padrões. O consumo, as vontades e as predileções seguem tendências tradicionalmente impostas e assim formam-se os ideais de perfeição. Até mesmo onde as preferências pessoais mais deveriam se impor, nos relacionamentos afetivos homem-mulher, entende-se que é o senso comum quem dita as ordens. Entretanto, após contundentes diálogos com um amigo, aprendi a desmistificar concepções coletivas, o que discorrerei neste breve ensaio.

Maicou é um grande companheiro, desde os antigos tempos de faculdade. Um cara inteligentíssimo, animado, bem-humorado, só não é um exemplo de beleza grega. Hoje, maduros, nós frequentemente desenvolvemos longas divagações que abordam os mais complexos temas – entre eles, claro, o cotidiano das relações humanas. E foi por meio das experiências pessoais e da história de vida de meu amigo que pude derrubar, uma a uma, antigas teses tomadas como verdade até então.

Quando pré-adolescente e no início da juventude, me lamentava por não ter o dom da habilidade esportiva. Pensava que os rapazes com razoável desempenho em partidas de futebol teriam chances consideravelmente maiores que as minhas no início do trato com o sexo oposto. Esbravejei contra minha falta de intimidade com o gol, culpei meus pais por não terem me matriculado em uma escolinha de futebol quando eu ainda era criança, receei não ser um bom representante da espécie homem brasileiro bom de bola.

Maicou é um excelente jogador, o melhor goleiro que vi atuar. Tem bom domínio, visão de jogo, chuta bem, além de transmitir segurança à equipe quando está embaixo das traves. Titular do time da escola, do curso. Mas Maicou não foi feliz no quesito ser alvo da torcida feminina e não teve um início precoce com o mundo das mulheres como eu poderia imaginar. Não foi procurado por marias-chuteiras sedentas de fama e dinheiro. Segundo ele próprio, porque mais que saber jogar futebol, é preciso também ser bonito.

Nunca me dei bem com a música. Fiz aulas de piano, até esbocei uma apresentação para as mães dos outros alunos da minha professora. Larguei mão enquanto era tempo, não nasci para as partituras. Outro ponto forte que poderia me levar a ser notado pela sociedade foi deixado de lado cedo. Mas Maicou, pelo contrário, é um músico de grande reconhecimento social. Dedilha violão, guitarra, contrabaixo, viola e cavaquinho com maestria e aventura-se com qualquer instrumento que tenha teclas ou possibilite um batuque. Maicou tem banda, toca em bares, anima rodinhas de violão. Seria ele então o típico centro das atenções das mulheres nas noites boêmias? Não exatamente. Porque, segundo ele próprio, mais que músico, para isso é preciso também ser bonito.

Eu escrevo crônicas, arrisco uns contos. Mas não crio poemas, não gosto e não sei lidar com a lírica clássica. E poetas são charmosos, transmitem a intelectualidade necessária para mexer com os instintos íntimos de qualquer fêmea. Outra bola fora para mim. Mas não para Maicou. Maicou é poeta desde a juventude, tem incontáveis textos escritos. E mais: musica poemas, transformando-os em singelas canções de amor. Só que, incoerentemente, as fãs de literatura não batem à sua porta em busca de ouvir, a sussurros, poemas ao pé do ouvido. A explicação, segundo ele próprio, é que mais que a inspiração poética, é a beleza quem fala mais alto.

Minha altura não me incomoda. Sou baixo, mas não anão. Tenho um amigo, do meu tamanho, que diz que a vida dele seria outra se tivesse dez centímetros a mais. Seria mais percebido por onde passasse, faria sucesso em casas de show, alvo de olhares femininos de cobiça. Pode ser. Mas, adivinhem só, Maicou tem mais de dez centímetros a mais do que eu – logo, também a mais que meu amigo – e não é o tipo de homem caçado em boates e bares. Maicou justifica com a afirmação de que, para que os holofotes iluminem um único rosto, mais que atrelado a um corpo grande, é necessário ser delineado por um nível consideravelmente alto de beleza.

E Maicou não é um sujeito rejeitado pelas mulheres. Chega a fazer certo sucesso em determinados núcleos. Mas, sem dúvidas, sua história de vida pode ser usada para derrubar mitos sociais.

As concepções antes previamente aceitas de que mulheres buscam homens altos, músicos, jogadores de futebol ou com o dom da poesia romântica para mim já não são válidas. Com um único exemplo, alcei a conclusão de que ser bonito é sim fundamental. Nem mesmo as ideias de ser rico ou ter carro me fazem desviar do novo raciocínio, construído com base em concreta análise de caso. Inicia-se um novo tempo. Obrigado, Maicou.

domingo, 5 de setembro de 2010

Crônica bancária 2


Na mesa de atendimento ao público do banco, duas irmãs jogam conversa fora enquanto o funcionário pesquisa alguma informação necessária no sistema. Concentrado na tela, ele ouvira, entrando por um ouvido e saindo por outro, que uma delas morava na Itália e o dia de partir para a Europa se aproximava. Até rolava um sotaque meio brasiliano.

Elas aparentam uns trinta e poucos anos. O diálogo continua. A que parece um pouco mais velha fala mais e está bem mais arrumada, cheia de joias. É a que mora fora. Ela mexe na bolsa, tira um aparelho e o põe sobre a mesa. Diz para a irmã:

- Eu vou deixar este celular com você. Quando eu te ligar, aperta esse botão aqui que ele liga a câmera interna e eu vou poder te ver. Quer dizer... nem sei se no Brasil já tem essa tecnologia.

- Acho que tem sim, não sei.

- É muito bom. Só converso com minhas amigas lá na Itália vendo elas. O ruim é quando meu marido me liga e eu tô no motel, que eu tenho que ficar virando a tela pra parede pra ele não ver onde eu tô. Aí é complicado.

Como que por um choque elétrico, a concentração do funcionário desaparece instantaneamente. Uma risada contida de canto de boca ganha força e se transforma em uma gargalhada, daquelas de abaixar a cabeça para aproveitar o riso.

A cliente, claro, percebe e inesperadamente estende o assunto ao bancário.

- Não tô certa? Tenho que tomar cuidado.

Está. Certíssima. Pelo visto, viver no terceiro mundo ainda tem lá suas vantagens.

sábado, 4 de setembro de 2010

Parabéns, Centenário


"Há cem primaveras, cinco operários deram voz aos mais humildes. À uma nação. À tal República Popular do Corinthians. Como uma epidemia, Joaquim Ambrósio, Carlos da Silva, Rafael Perrone, Antônio Pereira e Anselmo Correia se multiplicaram. Tornaram-se joão, maria, rodrigo, fabinho, leozão, cachaça, márcio, renato, celinho, ulisses, fabi e tantos outros. Ilustres ou inominados. Anônimos, nunca. Corintianos! No plural, sempre".

Trecho da coluna Soltando a Bomba, intitulada "Parabéns, Centenário" publicada dia 1º de setembro pelo jornalista Renato Salles no jornal JF Hoje.

É nóis.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

100 vezes Corinthians


Eu esperei a vida inteira pelo dia 1º de setembro de 2010. A expectativa de ver o meu Corinthians chegar aos cem anos sempre foi enorme. Planejei vestir minhas camisas, me enrolar na bandeira, gritar para o mundo que faço parte do bando de loucos.

Planejei escrever o melhor texto sobre o Corinthians da minha vida. Afinal, já foram tantos. Planejei gastar todo meu conhecimento, meus anos de prazerosas pesquisas. Usar a criatividade ao extremo, produzir uma obra pra (minha) história.

Mas não vou fazer isso. Outros tantos o farão. Talvez bem melhor do que eu faria.

Só quero registrar meu orgulho de torcer por esse time. De ser feliz por ter uma coleção de camisas alvinegras. Uma coleção de memórias alvinegras.

Obrigado, meu Corinthians, pelas tantas oportunidades que tive de sair por aí trajado com um dos meus mantos no dia seguinte a um título. E por eu ter certeza absoluta que era vestido de corinthiano que eu deveria sair de casa ao acordar no outro dia da eliminação da Libertadores de 2006. De 2010. Do trágico fim de Brasileiro de 2007.

Obrigado por me fazer, ainda moleque, correr sozinho pela casa de braços abertos gritando “campeão do mundo”. Por ter acompanhado meu time três vezes ser o melhor do país. Por ter contemplado o futebol de Marcelinho, Edilson, Tévez e Ronaldo. Um amor que começou cedo e foi ratificado em 1997 – com um quase rebaixamento. Depois, anos de alegrias.

Não temos Libertadores. Ela ainda virá – e se não vier, sinceramente, não vai mudar nada. O que eu e meus semelhantes queremos, já temos. É a certeza de que sempre teremos nosso Coringão a lutar. Parece que o estádio vem aí – e se não vier, sempre teremos o planeta como palco para a maior exaltação de amor a uma instituição que o mundo já conheceu.

Obrigado, meu Corinthians, por cada grito de gol. Cada clássico inesquecível. Por ser inexplicavelmente diferente. Pelos tantos amigos (e alguns inimigos) que fiz e tantas sensações gostosas graças a esse mágico sentimento de ser 100% Corinthians. Cem vezes Corinthians. Cem anos de Corinthians.

domingo, 8 de agosto de 2010

Crônica bancária


Na fila para sacar dinheiro da máquina de autoatendimento no banco está um senhor idoso, acompanhado de uma mulher. Ele, de óculos de grau e roupa social. Um típico vovô. Ela, de vestido justo e curto, que deixa à mostra as grossas coxas. Deve ter metade da idade dele – e olha que já não é mais tão novinha.

A vez deles se aproxima. Ela pergunta, só pra ter certeza:

- O senhor entendeu, né? São 150 reais.

Ele para, olha para ela, pensa, fixa o olhar em um ponto inexistente. Levanta uma das sobrancelhas e trava a boca em forma de “o”. Parece buscar na memória o exato instante do diálogo em que o acordo fora firmado. Questiona:

- Ué... Não era 50?

- Não! Eu avisei antes pro senhor. O preço é 150.

- Ummm. Mas não é mesmo 50?

Não, não era. E trato é trato. Hora do saque.




Será que é parente daquele famoso velhinho?

sábado, 17 de julho de 2010

Histórias que a bola não contou (e nem vai contar) – Parte final – Você decide

27 de julho de 2014: O mundo para depois de 64 anos para assistir outra final de Copa no Maracanã. Em campo, os dois maiores rivais do futebol mundial: Brasil e Argentina. Nunca se viu tamanha festa em qualquer canto ao redor do globo. Uma multidão de fotógrafos se aglomera para registrar a subida ao gramado dos dois times. Os capitães Mascherano e Thiago Silva puxam as filas.


O Brasil está armado com Júlio César, Rafinha, Thiago Silva, Alex Silva e Marcelo; Denílson, Lucas, Ramires e Paulo Henrique Ganso; Neymar e Alexandre Pato. O banco de reserva tem bons nomes, como o goleiro Renan, Rafael Tolói, Sandro, Guilherme, Douglas Costa, Dentinho e o veterano Kaká. Os holofotes argentinos estão todos sobre o atacante Lionel Messi, outra vez em grande fase, com a chance de provar que pode jogar como no Barcelona e voltar ser a ser o melhor do mundo, repetindo 2009 e 2010.

Pelo lado verde-amarelo, o grande astro é o meia Ganso atual dono da 11 (não quis a 10 para evitar comparações com Pelé, outro ex-Santos). Desde que deixou o time da Vila Belmiro, no meio de 2011, o jogador coleciona conquistas. Vendido ao modesto Udinese, encantou a Itália em sua primeira temporada e levou a equipe ao Calcio. Marcou 36 gols em 34 jogos e anotou 23 assistências. Foi vendido ao Milan por um preço quatro vezes maior. Ganhou a vaga de Kaká na Seleção, é chamado de “novo Zico”. É o atual melhor do mundo, com grandes chances de renovar o título. Na Copa 2014 marcou três vezes em seis jogos – e seis vitórias. Fez o gol que eliminou a Espanha nas semifinais. Seguramente vai estar no dream team da competição.


O sucesso de Ganso é tanto que reina no país a chamada Gansomania. Nos jogos do Mundial, os brasileiros levam apitos com barulho de ganso e bonés com pescoço e bico da bela ave para homenagear o craque. Essa Seleção resgatou de vez o orgulho de torcer pelo país.

A expectativa é grande. Ouve-se o Eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor nitidamente do estádio. A festa é maravilhosa. O macaco Goró, do zoológico do Rio, comeu a banana do prato brasileiro e ignorou a com a marca portenha. Rola a bola.

O jogo é um misto de futebol arte e futebol força. Dribles, cortes secos, tabelas e, sempre que possível, pisões e fortes entradas. Dois cartões amarelos para o Brasil no primeiro tempo e três para a Argentina. A cada lance de ataque brasileiro, o Maraca se inflama. Gritos questionando a masculinidade dos atletas adversários divertem o estádio. As câmeras flagram diversas modelos em roupas decotadas e justíssimas torcendo pela Seleção. A bola – batizada de Jaci – não entra.


Num lance rápido no início do segundo e com um passe de Messi, o atacante Agüero abre o placar. E o que os argentinos chamavam de Maracanazo-azo vem à tona. A torcida argentina, apoiada por um ou outro uruguaio, levanta cartazes escrito 1950. Aos 87 minutos de jogo, Dentinho (que entrou na vaga de Neymar), sofre falta na área. Pênalti para o Brasil. Catimba, empurra-empurra, mais três cartões amarelos. Ganso pega a bola, confiante.

Agora você decide:

a) Ganso se concentra e bate forte. Pra fora. Os argentinos comemoram. Ganso senta e chora. O Brasil chora. O pior pesadelo aconteceu. Os argentinos fazem festa, dançam cumbia, dançam samba, dançam tango. O técnico Maradona solta uma piadinha atrás da outra e manda beijos irônicos para a torcida. O técnico Mano Menezes é demitido imediatamente após a partida.

Messi foi eleito o melhor da Copa. A carreira do jovem Ganso nunca mais foi a mesma. Jamais conseguiu se firmar na Seleção de novo. Ficou conhecido como o gênio que poderia ter sido e não foi.


b) Ganso se concentra e bate forte. Golaço. O craque beija o símbolo da CBF, corre de braços abertos e é interceptado por uma multidão amarela de jogadores, que o abraçam. O time ganha moral. Parte para a prorrogação e pressiona, até chegar ao vira-vira, num chutasso de Pato. De virada é mais gostoso.

Ganso é eleito o melhor da Copa e revalida o posto de melhor do mundo. Vira boneco de plástico, sucesso entre as crianças. Entra para o hall dos atletas imortais e começa a ser comparado com Pelé. Diz-se que se mantiver o nível, poderá ultrapassar o Rei em questão de anos. Palavras da crítica esportiva e de craques do passado como Beckenbauer, Sócrates, Júnior, Platini, Bergkamp, Baggio, Zidane, Ronaldo e Ronaldinho.

O hexa é nosso!


No meio esportivo, e especialmente no Brasil, a diferença entre mitos e vilões é de uma tenuidade incrível, injusta e irracional. E segue a vida.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Histórias que a bola não contou – Parte V

2 de julho de 2010: O relógio marca 42 minutos do segundo tempo quando Daniel Alves ajeita a bola para cobrar a falta que pode empatar em 2 x 2 o duelo entre Brasil e Holanda pelas quartas-de-final da Copa do Mundo. O lateral-ala-meia se concentra e mira a pelota, sabe que o sonho do título em território africano depende – e muito – do seu chute. Daniel ainda não apresentou seu melhor futebol em nenhum jogo do mundial, é agora ou nunca. Lembra-se de Branco em 1994. Respira. Não toma distância e chuta. A bola viaja e acerta o ângulo esquerdo do goleiro Stekelenburg (aproveite e aprenda pelo menos como se escreve o nome do guarda-metas laranja: S-te-ke-len-burg). O estádio Nelson Mandela Bay vive seu momento de maior euforia.

O Brasil, que já vinha melhor desde meados do segundo tempo, cresce de vez na partida, mesmo com um homem a menos, após a expulsão do volante Felipe Melo depois de um pisão irracional no meia Robben. O treinador Dunga põe o time para frente e tira Gilberto Silva para dar lugar a Grafite. E começa a prorrogação.

Com sinais de cansaço dos atletas dos dois lados, o jogo perde fôlego. Um ou outro chute a gol e o apito final, é hora de decidir nos pênaltis quem passa de fase. Boas lembranças vêm, agora, de 1998.

Dunga conversa com seus comandados. No primeiro tiro, Kaká converte. Assim como Daniel, Michel Bastos e Nilmar. Júlio César para os chutes de Robben e Sneijder e a Seleção está nas semifinais.


O jogo contra o Uruguai é fácil – 3 x 0. Os favoritos Brasil e Espanha decidem a Copa da África do Sul.

O primeiro tempo é do time vermelho, que abre o placar com o artilheiro David Villa e tem a defesa mais bem postada, segundo palavras do narrado Luciano do Vale. Já no início do segundo tempo a torcida brasileira exercita sua fúria e fala mal do Dunga, xinga o Felipe Melo. Cadê a renovação, os meninos da Vila? A liberdade de imprensa? Começavam até a levantar um mosaico em pleno Soccer City com uma foto do Ronaldinho Gaúcho matando uma bola no peito quando Kaká empata a partida. Agora ninguém sabe mais se apoia, se corneta, se escreve alguma coisa sobre o Galvão Bueno no Twitter. É final de Copa do Mundo, amigo.

Quando Kaká marca seu segundo gol em uma linda jogada individual e decreta a virada, o mundo enaltece de vez o poderio do futebol brasileiro. Toda a torcida grita Brasil e o pessoal do mosaico vira ele ao contrário, e mostra uma caricatura do Dunga levantando a taça e os dizeres Obrigado, professor!. A modelo paraguaia Larissa Riquelme promete desfilar nua na Sapucaí no próximo Carnaval.


Na entrevista depois do jogo, o técnico brasileiro dedica uma série de palavrões a todos os jornalistas do mundo. Exalta seus comandados, reafirma que sempre soube o que fazia. Manteve-se a coerência.


segunda-feira, 5 de julho de 2010

Histórias que a bola não contou – Parte IV

1º de julho de 2006: Enquanto o atacante Henry comemora o primeiro gol do duelo entre França e Brasil pelas quartas-de-final da Copa do Mundo, o técnico Carlos Alberto Parreira conversa com Adriano no banco de reservas. O time verde-amarelo estava armado do meio para frente com Gilberto Silva, Zé Roberto, Juninho e Kaká; Ronaldinho e Ronaldo. Sai o pernambucano, Ronaldinho recua e o Imperador assume a frente. Restam 33 minutos de bola a rolar no gramado alemão, terra dos atuais campeões do mundo.

Com a mudança, o Brasil consegue criar jogadas, mas não conclui bem. Parreira ousa outra vez: Robinho em vez de Zé Roberto. O jogo é do time amarelo. Gilberto Silva é um carrapato em Zidane. Lúcio não deixa Henry tocar mais na bola. Faltam 21 minutos.

Kaká tenta de longa distância, o goleiro Barthez defende. Ronaldinho arrisca por cobertura, Barthez segura. Cafu tenta cruzar, erra e a bola quase entra, Barthez espalma. Ronaldo bate colocado. Barthez. Restam dois minutos. Gilberto Silva mata um contra-ataque francês e lança Adriano. Já passa dos 45. O Imperador ajeita para a perna esquerda, solta a bomba e marca um golaço. Sai correndo, tira a camisa, faz pose de Hulk antes de ser vítima de um montinho formado pelos outros 22 atletas brasileiros – a maior aglomeração humana de esbanjamento de felicidade da história dos mundiais.

Na prorrogação o Brasil joga por música. Confiante, o time canarinho enche os olhos da torcida com toques de primeira, lances de calcanhar e passes precisos. É questão de tempo para o gol. Kaká recebe pela direita, corre a largas passadas, aplica um drible da vaca no lateral Abidal e entrega a pelota a Robinho, que chega pelo centro. O garoto pedala para cima de Makélélé, passa fácil e lança Ronaldinho na esquerda. É a vez do Showman deixar Govou e Sagnol para trás com um único corte seco e lançar a bola na área para Adriano. O Imperador mata no peito, finge que chuta e toca para o lado, de onde surge Ronaldo por trás de Gallas para finalizar com estilo, decretar a virada e anotar seu décimo sexto gol na história das Copas – o maior artilheiro de sempre. Os cinco craques se abraçam e a imagem dessa união de gênios é capa de todos os jornais esportivos do mundo no dia seguinte. Fim de jogo, Brasil nas semis de novo.


Assim como há oito anos, os le bleus sucumbem frente ao poderio verde-amarelo e ganham de vez o rótulo de fregueses. Toda a crítica esportiva do planeta questiona se alguma equipe seria capaz de vencer o Brasil, talvez a melhor equipe de todas as copas. Os jogadores, o treinador, a torcida, todo mundo ri à toa.

É, mas a alegria não durou muito. No próximo jogo o Brasil pareceu não ter entrado em campo, jogou mal e acabou sendo eliminado por 1 x 0 pro Portugal de Felipão, num gol feio do luso-brasileiro Deco. Portugal perdeu nos pênaltis a final para a Itália – já especialista em vencer mundiais nos penais.


Dizem que ficou claro que o excesso de liberdade dado aos atletas brasileiros prejudicou o time. Uma vergonha à vencedora história do país nas copas. Metade dos jogadores anuncia que não joga mais pela Seleção. Deve ter faltado comprometimento, amor à camisa.

sábado, 3 de julho de 2010

Histórias que a bola não contou – Parte III

30 de junho de 2002: Termina o primeiro tempo no International Stadium Yokohama em 0 x 0. Brasil e Alemanha estão empatados em seu primeiro confronto em uma Copa do Mundo, já decidindo um título. O time da Família Scolari está ligeiramente melhor, mas não se considera favorito, pois, como sentenciara o poeta-locutor Galvão Bueno a Alemanha é um time que quando joga bem, ganha, e quando joga mal, ganha. As esperanças verde-amarelas estão nas chuteiras de Ronaldo, herói do tetra em 1998, e que parece ter ressurgido para calar os incrédulos após outra lesão. Os germânicos apostam no faro de gol do matador Klose.

O jogo não é só dos centroavantes. Os guarda-metas Oliver Kahn e Marcos também são astros de suas constelações e, com atuações sobrenaturais, fecham seus gols contra as investidas do ataque adversário. Enquanto Marcos tem trabalho com Klose e Neuville, Kahn se desdobra para segurar o trio de erres que quase leva Galvão à loucura: Ronaldo, Ronaldinho e Rivado.

Os anfitriões japoneses dividem-se entre os fanáticos pela magia do futebol brasileiro e os adoradores da eficiência alemã. O estádio está um caldeirão. O segundo tempo recomeça.

Ronaldo tenta a arrancada, Ronaldinho a jogada de drible curto e Rivaldo o chute de longa distância. Roberto Carlos com as bolas paradas. Nem pensamento passa pelo goleirão alemão com cara de mau. O Brasil pressiona por 22 minutos, sem sucesso. E a velha máxima entra em cena: quem não faz... tem que tomar.

No contra-ataque, em um forte chute, Klose vence Marcos e abre o placar. Os gélidos germânicos se abraçam e já se reposicionam. Muda a estratégia, hora de segurar a pressão canarinha. Aos 34, o jogo ganha números finais. O artilheiro europeu recebe de Schneider e amplia: dois da Alemanha, dois de Klose, que se torna assim, isolado, o maior marcador de gols primeira Copa do novo milênio.


Com o apito final, o Brasil chora e volta a sentir a decepção de perder uma final após oito anos. Felipão é impiedosamente criticado por ter apostado em um Ronaldo sem condições de jogo e fora de forma e ter preterido Romário, o maior atacante em atividade no país. O treinador gaúcho é acusado de impedir o Baixinho de participar de seu último Mundial. A imprensa esportiva brasileira noticia o que o país inteiro já sabia: o esquema 3-5-2 jamais daria certo por aqui. Marcos perde a santidade e, mesmo com o título de melhor jogador da competição, recebido na véspera da final, deixa a Seleção pela porta dos fundos.

Os alemães celebram seu tetra com cerveja e salsichão. Tem início por todo o Extremo Oriente um movimento conhecido por germanomania – os japoneses puxam a fila e, como tradicionais puxa-sacos, pintam os cabelos de loiro, usam lentes azuis e camisas brancas da máquina de jogar futebol com quatro estrelas. Os nipônicos nascidos recebem nomes complicados alemães. O estádio da final é batizado de Arena Miroslav Klose. Para eles, a primeira Copa da Ásia foi um sucesso.


terça-feira, 29 de junho de 2010

Histórias que a bola não contou – Parte II

12 de julho de 1998: A Seleção Brasileira pisa no gramado do Stade de France para enfrentar os donos da casa, ser campeã e esquecer de vez o fantasma de 1994. Terminar a copa com quatro títulos mundiais e se igualar à Itália é questão de honra. Os canarinhos tentam aparentar confiança, apesar do estádio todo azul e dos problemas da noite anterior. Circulava nos bastidores a informação de que o craque Ronaldo não jogaria, reflexo do mal estar culminado em convulsões na madrugada. A torcida verde-amarela temia que o time não produzisse sem o garoto Fenômeno. Ninguém confirmava ou desmentia, até que o nome de Edmundo apareceu na relação dos atletas que entrariam em campo.

O jogo começa e o Brasil tem como dupla de ataque Edmundo e Bebeto. O Animal ainda vive a boa fase que deu ao Vasco o título brasileiro do ano anterior. O comportamento irracional, no entanto, mantém-se. A câmera mostra Ronaldo no banco, meio amarelo, olhos meio fechados, um pouco suado, com um blusão de frio. Até a cabeça parecia maior. Dificilmente entraria em campo.

Aos seis minutos de bola rolando, o astro francês Zinedine Zidane parte com a bola dominada no meio-campo e quem aparece para recuperá-la é Edmundo. Com um toque genial, o camisa 10 azul aplica um preciso chapéu sobre o atacante brasileiro. Edmundo não deixa por menos e crava uma de suas chuteiras na coluna de Zizou. Ele cai, geme de dor, é imediatamente levado de maca. O árbitro apresenta seu cartão amarelo a Edmundo e diz que na próxima dividida ele está fora. O francês passa por uma minicirurgia caseira à beira do gramado e volta a campo ainda no primeiro tempo. A torcida o aplaude de pé.

O técnico Zagallo procura um substituto para o Animal no banco antes que ele seja expulso. A única opção é Ronaldo, baqueado. O craque entra, sob vaias do Stade de France. Já tinha quatro gols na copa e estava a dois do croata Davor Suker. Edmundo deixa o campo nervoso, chuta a placa eletrônica que indicou a substituição, chuta o quarto árbitro, chuta o banco de reservas, chuta o Zagallo. Ronaldo tenta três arrancadas e é malsucedido em todas, mal consegue se mover.

A partida é monótona até que os deuses do futebol resolvem que ela deve entrar para a história. Nos primeiros instantes do segundo tempo, um escanteio para o Brasil. Rivaldo coloca a bola na área, na cabeça de Ronaldo, que abre o placar. Quase não consegue comemorar. A torcida azul grita ainda mais, confia no primeiro título francês. Zidane está apagado. Próximo lance, outro escanteio. Rivaldo, bola, cabeça, Ronaldo, gol. Inacreditáveis dois a zero. Artilharia da competição.

Em um dos poucos ataques franceses, o goleiro Taffarel se choca com Zidane, que vai ao chão, nocauteado. Silêncio e apreensão entre os le bleus. A França perde forças para tentar a virada. Com o jogo definido, os dois times tocam a bola e esperam o apito final. A torcida francesa rende-se à genialidade do time Canarinho e, cordialmente, enaltece os atletas brasileiros. Nos acréscimos, em um contra-ataque mortal, César Sampaio recebe de Bebeto e dá números finais à partida: 3 x 0.

Dunga, enfim, levanta a taça de campeão do mundo. Zidane aplaude a cena e diz ter perdoado Edmundo – coisas do jogo. Bebeto apaga o trauma de 94. Ronaldo é eleito pela revista francesa World Footballer o maior jogador da era pós-Pelé e ganha uma estátua de bronze na entrada do Stade de France. Esculpiram ele até esbelto, bem disposto, de braços abertos como o Cristo, com o dedinho levantado e tudo.


domingo, 27 de junho de 2010

Histórias que a bola não contou - Parte I

17 julho de 1994: Os olhos do mundo voltam-se para uma penalidade. Nos Estados Unidos, Brasil e Itália decidem quem será o primeiro tetracampeão mundial de futebol. Pelo lado canarinho, Romário, Branco e Dunga já marcaram e Márcio Santos desperdiçou. Na Esquadra Azurra, apenas Albertini e Evani converteram. Baresi e Massaro perderam as oportunidades. O próximo a cobrar é o italiano Roberto Baggio. Se ele errar, o Brasil é tetra. Baggio se concentra, caminha e bate. Taffarel cai para a direita e ele acerta o ângulo esquerdo. Golaço.

O jogo segue. O próximo é o Bebeto. Ele está nervoso, a quarta estrela depende do seu chute. Faz cara de choro, treme. Suando frio, não toma distância e bate forte, mas o goleirão Pagliuca voa até o canto e segura a bola rente ao corpo. Bebeto chora. Os italianos comemoram, ainda estão vivos na partida. Empatados em 3 x 3, Brasil e Itália partem para as cobranças eliminatórias alternadas. Em melhor momento psicológico, os europeus recomeçam a série. O meio-campo Donadoni pega a bola, ainda rindo, e converte fácil o quarto tento da Azurra. O Brasil precisa marcar para continuar na disputa. A responsabilidade é do irreverente Viola, reserva da equipe. O atacante dá tchau para a torcida azul, olha a bola, faz uma dancinha marota antes de chutar e bate pra fora. Bem pra fora.


Os italianos comemoram, invadem o campo, dão cambalhotas. A televisão mostra ao mundo o narrador italiano gritando e comemorando o tetra abraçado com o ex-jogador Paolo Rossi. Os brasileiros consolam Viola, já às lágrimas. Zagallo questiona o juiz se não havia mais cobranças – perdera a conta. A culpa da derrota cai sobre o técnico Carlos Alberto Parreira e o futebol implantado por ele, pragmático, sem um camisa 10, sem espetáculo, de fracasso previsível. No aeroporto, no retorno ao país, uma multidão recebe o time canarinho com insultos e uma faixa enorme, escrito em letras garrafais: time de pipoqueiros. Baggio é eleito o melhor jogador da copa e o melhor jogador do mundo nos próximos dois anos. Deixa a Juventus e é vendido ao Real Madrid por 112 milhões de dólares, a maior transferência do futebol mundial até hoje.

Bebeto vira sinônimo de medroso. Parreira, de burro. Viola foi, por uns tempos, inimigo público número 1 do povo brasileiro e até hoje é motivo de piadas no mundo inteiro. Depois de ficar famoso mundialmente, chega a jogar uma temporada num time pequeno italiano, mas não faz sucesso. Converteu-se ao budismo e diz ter encontrado a paz interior. Vez por outra dá entrevistas a TVs italianas e diz nunca ter entendido o que aconteceu com ele naquele fatídico 17 de julho. O dia que todos os brasileiros querem esquecer.


quinta-feira, 10 de junho de 2010

Entrevista com o Ninja Brasileiro

Exclusivo!

O maior heroi nacional, o Ninja Brasileiro, falou pela primeira vez com uma equipe de reportagem e concedeu entrevista exclusiva em sua árvore.

E o mais surpreendente, concordou em aparecer sem os óculos escuros. O heroi conversou sobre sua história e sua busca incessante por justiça sociais.

N

sábado, 5 de junho de 2010

Sócrates e Sócrates


Depois de alguns séculos, a porta da Sala das Almas Elevadas foi aberta. Pelo próprio Chefe, o Poderoso. Nesse ambiente ficam os espíritos dos seres mais iluminados, enquanto aguardam para descer (como eles chamam encarnar, nascer, viver na Terra). O ano era 469 negativo (como eles chamam o período antes de Cristo). O Comandante andou um pouco, cumprimentou três ou quatro almas e avistou quem ele queria, os dois estavam preguiçosamente sentados no canto da sala, ao lado de uma pequena mesa redonda, beliscando uns petiscos, tomando cerveja e discutindo política.

O Chefe gritou de longe:

- Ô Sócrates!

Os dois olharam ao mesmo tempo. Ele riu, adorava brincadeirinhas assim. Lá estavam Sócrates e Sócrates. Um mais alto, magro, com a barba negra e o outro mais baixinho, um pouco calvo, barba bem maior. O Poderoso explicou que fora pessoalmente à sala iluminada porque ainda não se decidira por qual deles enviar ao mundo humano em breve. Foi trocar ideias com eles.

Os dois se mostraram surpresos, pediram mais informações. O Mestre explicou: “Vocês dois se destacarão na Terra. Só que um vai agora, o outro só daqui uns 2400 anos”. Eles se entreolharam, em princípio não tinham pressa para descer. Queriam saber como seria a vida de cada um.

“Quem for primeiro, nasce na Grécia. O outro, no Brasil. O primeiro será filósofo e fonte de estudo por muitos milênios nos campos da ética, do parto de idéias e da democracia. Sua nobreza será reconhecida até em seu ato de morte. O segundo será atleta e médico, ídolo do povo, também famoso por discussões sobre democracia” – detalhou o Poderoso.

A briga parecia boa. Como as duas vidas aparentavam ser sensacionais, os dois Sócrates cobiçavam a primeira vaga, até para ver logo como era o tal mundo dos vivos. O Chefe acrescentou que quem fosse primeiro seria eternamente conhecido como um gênio do conhecimento. Já o último teria o calcanhar abençoado. O Criador finalizou: “Quem for agora, terá a honra de conviver com Platão e Aristóteles. O segundo marcará época ao lado de Casagrande e Zico”.

Foi aí que o Sócrates magrelo da barba preta levantou a mão e disse: “Eu vou depois”. O Poderoso olhou para o outro Sócrates, que consentiu, com sinal de positivo. O Chefe fez anotações na prancheta, se despediu e foi saindo.

O que iria nascer dali a pouco já estava ansioso pra conhecer o tal Platão. O que só iria depois dava uma risadinha marota de canto de boca. Sabia que o Corinthians só seria fundado em 1910.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Novos tempos


Há anos quero conhecer Ibitipoca. Pra qum não sabe, lá há um parque florestal, com cachoeiras, grutas e montanhas. Fica a pouco mais de uma hora de Juiz de Fora e é reduto de muita gente da região em feriados e época de férias. O parque fica ao lado da vila do Arraial de Conceição de Ibitipoca, famosa por eventos, como Réveillon, carnaval e festival de jazz, no frio do meio do ano. A vila pertence ao município de Lima Duarte, a uns 20 quilômetros.

A última vez que quase conheci o lugar foi no Réveillon passado. Articulei, convoquei minha turma da faculdade, parentes, amigos de infância. Mas não deu certo e não foi dessa vez. Achei que tão cedo não iria ver de perto a casa dos malucos, hippies e roqueiros da Zona da Mata mineira.

É, mas o mundo dá voltas. No início da noite de sexta-feira recebi um telefonema. Do Banco do Brasil de Lima Duarte, me convocando para trabalhar na cidade. Em poucos dias vou, sem data pra voltar.

Caratinga, Inhapim, Resende Costa, Itaguaí, Ouro Preto, Manhuaçu, Juiz de Fora. Viçosa. São Mateus. Lima Duarte. E tá só começando.

Imagem meramente ilustrativa

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Clandestino


Viagem de volta para casa. O ônibus até que era confortável, daqueles que a poltrona quase deita e tem apoio para as pernas. Se nada desse errado, estaria em casa em mais ou menos 11 horas. Na poltrona 35, eu já estava pronto para partir: blusa de frio, pacote de salgadinhos, fone à mão, livro aberto. Após alguns estranhos minutos de demora para partir, entendi o porquê: um clandestino – que viajava encolhido atrás da 46, escondido entre o último banco e a parede do ônibus, em frente ao banheiro – fora descoberto.

O cara que o encontrou viajaria com a esposa e os dois filhos nas últimas quatro poltronas do lado do condutor do coletivo. Coincidentemente era policial. Chamou o motorista, que ao ver o rapaz agachado, exclamou o que deixou todos os passageiros ainda mais confusos: “Ah, não! Você aqui de novo?!”

O clandestino se levantou. Disse ser menor de idade, embora fosse a maior pessoa do ônibus. Magrelão. Os traços pareciam mesmo de uns 16 ou 17 anos. Revelou que vinha de Goiânia e sua intenção era ir até o Rio de Janeiro. Disse ser da favela do Jacarezinho. A PM foi acionada e ele ficou por lá. O ônibus partiu. Dizem que até uma equipe de TV apareceu por lá para entrevistar o rapaz.

Eu me perguntava se, caso seus planos tivessem sucesso, ele aguentaria o frio da noite com aquele shortinho. E, dada a indignação do motorista, qual era a frequência das viagens interestaduais daquele jovem.

Qual seria a hora certa de entrar no ônibus sorrateiramente? E de sair? Teria uma técnica para pular para uma poltrona vazia sem ser percebido? Talvez deitado, pelo compartimento superior de malas. E se a vontade de ir ao banheiro batesse de uma vez, com ele agachado lá atrás, como faria? Refiro-me ao número dois.

Quantos estados ele conhecia? Será que viajava gratuitamente e, ao chegar ao destino, participava de eventos com entradas despercebidas por seguranças e organizadores? Tipo: segunda, cinema. Entra por cima, na salinha do projetor. Terça: teatro, pela janela do camarim. Quarta: futebol, fantasiado de mascote cabeçudo. Quinta, show sertanejo. Esse é fácil, só entrar de chapéu, segurando um violão e se dizer o roadie da banda. Sexta, cervejinha em boteco chique. Camisa branca, gravata borboleta e atender dois ou três pedidos de clientes, fazendo-se de garçom. O sábado sempre varia, de feira de filhotes a calourada do DCE. De vale-tudo a show do Franz Ferdinand. De automobilismo a casas de striptease. Domingo, dia de entrar em outro ônibus e conhecer outros lugares, outras culturas, outras pessoas.

Será que já conheceu a Europa, viajando clandestinamente de avião? Ou de navio. De iate? Falava outras línguas, pelo menos inglês? Amazônia, Pantanal? Será que já entrou sem credencial em uma coletiva do Dunga? Tudo deve ter começado quando, aos 11 anos, foi à primeira festa de 15 anos como penetra. Nunca mais parou.

A tranquilidade do clandestino enquanto se levantava do esconderijo, logo ao ser desmascarado, me marcou. Que segurança, que certeza do que fazia. Olho pela última vez para a 46 e tento me concentrar no livro em minhas mãos, a cidade ficou pra trás. A viagem vai ser longa.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Uma penalidade

O jogo acabou. Pelo menos o tempo de bola rolando. Parecia que não terminaria nunca, que partida tensa. Eu tentei muito, mas não consegui jogar bem. O time dos caras é bom, marca bem. Cento e vinte minutos de futebol e ainda zero a zero. Falta pouco.

É o jogo mais importante da minha carreira. Sonhei a vida inteira em estar aqui, agora. Sei o tanto que todos confiam em mim, meus companheiros e meu povo. Eu fiz por onde, sou o atual dono do título de melhor jogador do mundo. Como eu, hoje, talvez só um brasileiro e um búlgaro. O argentino está parando.

Minha história no esporte passa como um filme em minha mente. Desde o comecinho, no Vicenza. Lembro-me do meu primeiro técnico, que me apelidou de Zico, meu eterno maior ídolo, pela habilidade. Lembro-me de quando eu assistia ao Flamengo pela televisão, pra aprender um pouco com o esquadrão de Zico e Júnior. Parece ironia agora.

Será que todas essas pessoas me olhando conhecem minha história? Será que sabem que, quando fui contratado pela Fiorentina, quase tive que parar de jogar bola por conta de uma gravíssima lesão no joelho? Sem falar nos 220 pontos que tomei para costurá-lo.

O mundo lembra que, depois, já na Juventus, acusado de mercenário e traidor pela minha ex-torcida, me neguei a cobrar um pênalti contra a Fiorentina? Uma penalidade que, com certeza, não marcou minha carreira. O cara que bateu, errou. Mais tarde, em lágrimas, beijei um cachecol violeta da Fiorentina e, outra vez, fui aplaudido por eles.

Em 1990 deixei o meu contra a Argentina, na semifinal, na disputa por pênaltis. Mas perdemos.

Se o meu time está aqui, agora, deve muito a mim. Depois do sufoco na primeira fase, fui decisivo no mata-mata. Guardei dois contra a Nigéria, na vitória de virada. Deixei um contra a Espanha e outros dois na surpreendente Bulgária no jogo passado. Falta pouco para o final feliz.

Meu país depende de mim. Sou o líder, o craque, o camisa 10.

Sempre sonhei, desde menino, jogar uma final de Copa do Mundo. O rival dos meus sonhos era o Brasil.

O treinador me grita:

- Roberto, cê bate o último?

- Claro, professor.




Minha pequena homenagem ao gênio italiano Roberto Baggio. Na carreira, Baggio converteu 76 penalidades em 91 cobradas. Uma delas, na partida de quartas-de-final contra a França, na Copa de 1998. A Itália, mais uma vez, foi eliminada.

domingo, 30 de maio de 2010

O Ninja Brasileiro

Todo povo precisa de herois. Qualquer sociedade carece de referências de parâmetros de caráter, coragem, atitudes. Assim surgem os mitos.

O Brasil sempre viveu de importar cultura enlatada, cultuando ídolos distantes. Até o momento em que surgiu um super-heroi nacional, lutando por seus semelhantes e sua nação. Em minha primeira experiência cinematográfica, apresento o Ninja Brasileiro, aquele que veio defender seu povo e explanar seus ideais.





Requisito a crítica honesta de Thiago FC e João Luis Jr., ambos reconhecidamente adoradores de cinema, de herois, de reencontros de amigos, do Brasil (?) e de produções caseiras.

sábado, 29 de maio de 2010

Dream Timão

1 - Dida. 2 - Alessandro. 3 - Chicão. 4 - Gamarra. 5- Vampeta. 6 - André Santos. 7 - Marcelinho Carioca. 8 - Rincón. 9 - Ronaldo. 10 - Ricardinho. 11 - Edilson.

Esse time nunca jogou junto. Nem vai. Mas, na minha imaginação, joga. Foi a equipe que montei com os melhores de cada posição que vi pelo meu Corinthians, a convite do meu amigo, o jornalista Matheus Espíndola para a seção Que time é teu?, do blog Fifa World Cano.

Como é bom poder sonhar.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

O time que eu vi

Faço parte de uma geração sortuda que, em sua maioria, tem os primeiros lances esportivos na memória relativos à Copa de 94. Já nos entendemos por brasileiros como campeões do mundo. Criancinha, aprendi que ganhar a Copa é bom, porque todo mundo fica feliz (até a mãe e a vó da gente, que nem entende nada de futebol) e tem carnaval na rua sem ser fevereiro.

Esta minha geração vai para o quinto Mundial em 2010. Somos os mais mal acostumados, privilegiados por ter visto dois títulos e um vicecampeonato pro Brasil. Mais que isso, vimos herois. Confesso que com o tempo deixei de ser torcedor fervoroso da seleção, mas com o que vi dá pra montar um esquadrão invencível.

Na seleção dos meus sonhos não tem Pelé, Garrincha, Zico e nem Sócrates. Destes, eu vejo sempre os mesmos cinco ou seis lances reprisados. E, com todo respeito, não precisamos deles.

Imagine um campo gigante. Uma trave com quantos metros quiser pra cada lado, a perder de vista. Agora suponha que a meta é defendida com a própria vida pela tranquilidade do Dida, a agilidade do Marcos e a técnica do Júlio César. Mas a camisa 1 do meu time, sem mais delongas, é do Taffarel.


A zaga é formada por Lúcio e Juan, orientados por Aldair e Márcio Santos (que não bate mais pênalti). O Aldair grita pro Juan: “Rouba a bola e toca pro Lúcio”, que recebe a ordem do Márcio: “Agora dá um bicão pra frente”.

A lateral direita é do Cafu. Por ali ele joga junto com o Maicon e, um pouquinho mais à frente, de ala, o Daniel Alves. Na esquerda, o Roberto Carlos é o rei. Se tiver falta de longe pra bater, pensei até em uma jogada ensaiada. O Roberto vem correndo, finge que chuta, e quem bate é o Branco, que surge de trás e pega o goleiro caindo. Golaço.

À frente da defesa, os volantes, cinco deles, pra não deixar passar nada. Por ali quem manda em tudo é o Dunga, o capitão da equipe (desculpe Cafu e Lúcio, não tem como tirar a braçadeira do cara). Esse mesmo Dunga, que hoje é criticado por todo mundo, já foi a alma da seleção, o dono do time. E, no meio-campo, berra à vontade: “Marca, César Sampaio! Sobe, Kléberson! Fica, Silva (nessa ele fala com o Mauro e o Gilberto)!”


O Kaká reina sozinho na meia direita. Se receber a bola ali, sai correndo a largas passadas e só para dentro do gol, sob os olhos eufóricos e orgulhosos do Parreira, Felipão e do maluco do Zagallo, os três lado a lado no banco. Do lado oposto do campo, só futebol-arte. Os craques Ronaldinho Gaúcho e o Rivaldo tabelam e se revezam – quando um é o meia-esquerda, o outro chega como segundo atacante. O Ronaldinho bate as faltas nos jogos mata-mata e os dois jogam com camisas 10. Mais pra frente, lá perto da bandeirinha do escanteio fica o Denílson, só pros turcos correrem atrás dele e a gente se divertir com isso.

O ataque é fabuloso. E, por falar nele, a função do Luís Fabiano é ficar parado na área à espera de um cruzamento ou um rebote para guardar mais um. O Bebeto dá passe pro gol de todo mundo e coordena as comemorações. O Ronaldo (ainda magro) vem correndo lá de trás com a bola dominada, fintando fenomenalmente quem cruzar seu caminho. Artilheiro de tudo. Dentro da pequena área, o maior do time, o gênio Romário.

Do outro lado, podem ser quantos e quais forem, de onde vierem, como jogarem. Por aqui, a bola sempre rola mais redonda.




Inspirado em Cai o primeiro zero do placar, de Humberto Gessinger.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Umas coisinhas, antes de começarmos


Foram meses e meses longe das letras. Meu lado escritor completamente adormecido.

Desde que deixei o Espírito Santo, meti-me a estudar para concursos públicos. Foram dias, noites, segundas a sextas e sábados e domingos lendo livros, fazendo provas e conferindo gabaritos. Antes, como primeira providência no retorno à minha boa e velha Minas Gerais, parei de escrever. Senti que precisava dedicar todo meu tempo à minha profissão de estudante. Decisão certa ou não, passei. Em alguns dias serei mais um funcionário do Banco do Brasil. Depois, ainda uma incógnita.

Hora de tirar um tempo pra mim. Estou pondo em dia alguns livros, acordando mais tarde, voltei a jogar CM0102 (e continuo, modéstia à parte, um expert do mundo manager), vou ler os blogs dos amigos (alguma sugestão?). E volto a escrever! Ainda tenho boas histórias que merecem ser registradas. Pretendo explorar mais a ficção, que, para mim, nada mais é que uma curta extensão da realidade.

Seguimos (espero) com nossa programação normal.



Umas coisinhas, antes de começarmos

A primeira coisa é que eu sei que a palavra bobagera não existe. Mas meu pai, mineiro, era assim que falava quando eu ainda era adolescente:

Devia era presta concurso pru Banco do Brasil, no lugar de ficar aí escrevendo essas bobageras.

Fiz as duas coisas. Entrei para o Banco do Brasil e continuei a escrever as bobageras. Um dia, deixei os carimbos de lado e fiquei só com as bobageras mesmo.

Cem melhores crônicas (que, na verdade, são 129) – Mario Prata